A. Moniz de Palme (Ed. 684)

Lagarteira, um antigo solar das Terras Lafonenses que faz parte do seu roteiro romântico

• António Moniz Palme

Ed684_DrMonizPalme_lagarteiraA bonita e aprazível Quinta da Lagarteira, em Várzea, S. Pedro do Sul, é um dos locais significativamente mais encantadores da nossa região, com a sua bela casa senhorial e um equilibrado logradouro rural que cativa e enfeitiça quem a visita. Os vergeis e frondoso arvoredo revestem o local do inefável rasto das antigas mouras encantadas, herança inevitável da Reconquista. E tais lendas sempre participaram do panorama literário e poético das margens do Vouga, enquadradas pela beleza telúrica dos seus campos e das suas colinas.

Lá viveu durante quase um século a Srª D. Maria Amélia Correia de Lacerda de Melo Cabral, filha de Maria Luísa Correia de Lacerda de Azevedo e Lemos, e de seu marido, Dr. António Cabral Melo Pinto.

Essa Senhora, a minha prima Maria Amélia, era popularmente conhecida pela Srª D. Maria Amélia da Lagarteira, tal era a influência do local nas pessoas que o habitavam. Na verdade, a Quinta da Lagarteira está envolvida pela leveza e subtileza das muitas e diáfanas histórias misteriosas que correm sobre o seu passado, algumas bem nebulosas, mas que acicatam a curiosidade de quem as pressente. Quais os motivos de tanta neblina a retirar a clareza do seu panorama e de alguma das sua histórias !!!?

Bem, a Proprietária era neta de José Correia de Lacerda Lemos Moura Telles Lebrim, um dos donos da famosa Casa de Beirós, alcantilada nos contrafortes das Termas de S. Pedro do Sul, e sobrinha neta de outro dos donos, o Conde de Beirós, António Tristão Correia de Lacerda Lebrim, que não teve geração. Procurando fazer luz sobre estes meus parentes e sobre a Casa da Lagarteira, refiro que há tempos vi publicada uma notícia, cujo conteúdo não foi nada do meu agrado pelas inverdades lá referidas.

Por isso mesmo, aproveito a ocasião para tentar restabelecer minimamente a verdade. Pois bem, corria invariavelmente de boca em boca que o Conde de Beirós, Tio Avô da proprietária da Quinta da Lagarteira, Srª D. Maria Amélia, era um perdulário gastador e um jogador inveterado, que aos dados tinha perdido toda a sua fortuna, deixando a família na miséria. Ora, nem por sombras tal corresponde à verdade. O Conde Beirós era uma pessoa impecável, que vivia para a Família, o Irmão e as Sobrinhas. Por sua vez, o seu irmão, avô da Srª D. Maria Amélia da Lagarteira, era um proprietário rural que se gastava a tratar dos respectivos bens, sendo ao mesmo tempo Provedor da Misericórdia de S. Pedro do Sul. Mas então, como nasceu essa atoarda do Conde jogador e as histórias colaterais que à volta da sua personalidade corriam?

Todavia, a ciência popular, transmitida de boca em boca, tem sempre algum fundo de razão. Mesmo com muitas confusões e invenções, não há, na verdade, fumo sem fogo. Eu explico aos Caros leitores: – Uma sobrinha neta do bondoso Conde, Mariana, irmã da Srª D. Maria Amélia da Lagarteira, casou com um senhor Agostinho Aragão, pelos vistos pessoa nada recomendável e que, através de estratagemas que se desconhecem, conseguiu vender tudo o que o conjuge e as cunhadas tinham e não tinham para pagar as suas dívidas de jogo, que, pelos vistos, atingiam um montante incalculável. Uma calamidade terrível que caiu naquela simpática e séria família. Nunca lhes passou pela cabeça que alguém casado com um membro da família cometesse uma infâmia daquelas!.. Enfim, factos tristes porque algumas famílias passaram e passam, causados pelo vício do jogo e por aderentes à família, que dão o golpe do baú, não olhando a meios para satisfazer os seus maus hábitos e vícios. Compreendem agora qual a razão porque não gostei da reportagem sobre um Conde de Beirós viciado na roleta e, principalmente não sério. Na verdade, quem desgraçou a família não foi o Conde de Beirós, mas um verdadeiro crápula bem diferente da sua pessoa e que ainda por cima, com o seu deplorável comportamento, lhe criou a fama de jogador inveterado.

Ora, estando agora salva a honra e a honorabilidade do Conde de Beirós e do seu irmão, voltemos à proprietária da Quinta da Lagarteira, e á simpática Srª D. Maria Amélia, falecida em Várzea em 12.01.1988, e que tinha casado em 1922, com um parente da minha família, natural da Torre de Moncorvo, Manuel de Vasconcelos Doutel de Figueiredo Sarmento. Digo, parente da minha Família, pois além da grande amizade que unia os da Lagarteira com os Monizes, era um primo muito chegado de meu Pai, pois era descendente de um primo direito do primeiro Barão de Palme, Joaquim José de Torres Porto Carrero, igualmente natural da Torre de Moncorvo. Este casal, Srª D. Maria Amélia e Sr. Manuel Doutel, teve vários filhos: – os gémeos Bernardo e Tristão Doutel, ambos já falecidos sem descendência, a Maria Amélia Doutel, nascida em 1929, simpática gestora agrícola e que sempre viveu  todo o ano na Quinta da Lagarteira, em Várzea, e a Maria de Deus Correia de Lacerda Vasconcelos Doutel, nascida em 1932, licenciada em matemática pela Universidade de Coimbra, que casou em 12.10. 1957, com  Licínio Pinto Leite, nascido a 29.12.1912 e falecido a 21.01.1986.

Como já referi, na Quinta da Lagarteira vive actualmente, conhecida por todos os Sampedrenses, a bondosa e simpática Amélinha Vasconcelos Doutel, e, onde, por vezes, se encontram os seus sobrinhos filhos da Irmã Drª Maria de Deus, a Mariazinha Doutel, que em solteira viveu muito tempo em S. Pedro do Sul, numa casa perto da Companhia, com os seus tios paternos, Dr. Bernardo, Germana e Manuela Doutel.

Qual a razão por que venho evocar a beleza da Casa da Lagarteira e os meus parentes, seus proprietários, perguntar-me-ão para finalizar?. A razão é triste e muito simples : -No decurso deste ano, os elementos da geração mais nova, sobrinhos da Amélinha Doutel, conjuntamente com a sua Tia, resolveram fazer grandes obras na casa, principalmente nos telhados. Infelizmente, no último dia dos trabalhos, qualquer improvidência havida provocou um incêndio que devastou completamente aquela bonita casa, não ficando pedra sobre pedra. A desolação foi grande e, claro está, que o desgosto foi profundo. Não falando já na família, muita gente tinha boas recordações daquele solar e da sua fragrante envolvência. E o património edificado lafonense ficou mais pobre. Os meus primos, Licínio Doutel Pinto Leite, Arq. Nuno Cabral Doutel Pinto Leite e suas Irmãs, Mãe e Tia que me perdoem por quebrar o seu triste recolhimento com a divulgação da triste notícia do ocorrido na sua bonita casa de família, que aliás de todos é conhecido, mas não podia deixar de publicamente lamentar esta desgraça e pedir-lhes que sejam corajosos e procurem reconstruir o que as chamas consumiram, Aproveito para juntar uma excelente fotografia tirada pelo meu amigo e artista, João Damas, que realça bem a beleza daquela casa. A reconstrução do velho solar constituirá certamente uma verdadeira fénix renascida, corporizando a história e o passado bem português do Solar da Quinta da Lagarteira.

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