A. Moniz Palme (Ed. 669)

Um Grande Senhor do Panorama Político Português – 1ª Parte

Ed669_AdrianoMoreiraHá bem pouco tempo, um Amigo de longa data dos tempos de Coimbra, Eng. Adelino Campante, criticou-me pelo facto de nunca ter escrito e publicado qualquer artigo sobre o meu amigo pessoal, Sr. Prof. Doutor Adriano Moreira, de que Ele, como eu, é grande admirador. Tal reparo, em parte, não corresponde à verdade por que no meu livro “ O Almofariz”, cujo prefácio foi por Ele escrito, uma série de páginas são dedicadas ao pensamento e à actuação política da sua pessoa.

Começarei por dizer que Mestre Adriano Moreira, desculpem assim o apelidar pois para mim foi e é um verdadeiro mestre, possui uma ampla e profunda preparação em vários campos, bem ao contrário de muita gente que por aí anda, falsos licenciados, com cursos tirados atrás de uma porta, mas que nos desgovernam com a falta de um mínimo de conhecimentos culturais, políticos e científicos e a ausência clamorosa dos valores morais assumidos pela grande maioria dos portugueses. Enfim, em contraposição com estes vagabundos da política, Adriano Moreira é uma personalidade rara e fascinante.

Durante toda a sua vida, teve um percurso relevante de trabalho intenso, de estudo e de reflexão política sobre os problemas que afligem a nossa colectividade. Não vou importunar o leitor com a enumeração dos diferentes cargos que Adriano José Alves Moreira desempenhou até esta data, mas sempre referenciarei que o Ilustre Transmontano, nascido em Grijó, Macedo de Cavaleiros, é doutorado pelo Instituto Superior de Ciências Políticas da Universidade Técnica de Lisboa e doutorado em direito pela Universidade Complutense de Madrid. Foi igualmente Professor Catedrático em diversos estabelecimentos universitários de ensino superior, nomeadamente em Lisboa e no Rio de Janeiro e foi Director do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Na verdade, um perfil bem diferente dos energúmenos que exploram o erário público com a protecção não se sabe de quem e por alma de quem. E, em matéria política, já que fiz uma comparação com alguns dirigentes da nossa praça, que na última dúzia de anos têm estado na berra, sempre direi que foi delegado à ONU, desde 1957 a 1959, e fundador do Movimento da União das Comunidades de Cultura Portuguesa, tendo presidido a dois congressos, em 1960 e em 1966. Quanto aos cargos que exerceu na vida partidária e a sua intervenção na vida pública, não vale a pena nada acrescentar, pois é demasiado conhecida a sua actividade e a sua permanente colaboração nos órgãos de comunicação social, nomeadamente em colunas regulares de diversos jornais e no aparecimento nos diferentes canais televisivos. E por aqui me fico.…!

Pois, foi este sábio da cultura portuguesa, este Homem excepcional que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente.

A minha Família foi viver para Coimbra afim de que os mais novos frequentassem cursos universitários na Cidade do Mondego.

O meu Pai, da sua estadia na Marinha de Guerra, guardou e manteve amizade com os seus camaradas de então, convivendo mesmo com alguns dos seus antigos companheiros. Um desses seus fiéis amigos, era o Almirante Lopes Alves que aparecia com a Mulher, Maria Ângela, em S. Pedro do Sul e, posteriormente, em Coimbra. Já era o Almirante Ministro do Ultramar, quando mandou avisar os meus Pais que iria jantar à Rua Castro Matoso, onde vivíamos e onde era sempre bem recebido, mas que levava o seu chefe de gabinete. Este era um jovem, para mim quase completamente desconhecido, mas que irradiava simpatia e simplicidade, no seu aspecto de transmontano ou de beirão como nós. Franco, modesto e a dizer frontalmente o que sentia, excepcionalmente culto, com uma enorme bagagem intelectual que encantou todos os que nesse dia jantaram em casa da Família Moniz… A sua carreira política prometia, principalmente por que se verificava que não seguia, em muitos aspectos, o itinerário da governação da República do Estado Novo, nomeadamente no campo da liberdade de expressão e em matéria de política ultramarina, o que agradou muito ao meu Pai, sempre interessado no que se passava nos territórios de além mar. Diplomaticamente, ia lamentando que Portugal tivesse esquecido, na sua administração, o que o País tinha aprendido com os antigos Comissários Régios, afastando-se das doutrinas de António Enes, dos ensinamentos de Mouzinho de Albuquerque, de Freire de Andrade, de Eduardo Costa, de Aires de Ornelas, de Paiva Couceiro, de Norton de Matos, que pretendiam a aplicação a cada território de uma lei orgânica própria, adaptada às condições locais e culturais das respectivas populações, prevendo nos seus articulados a aceitação dos costumes indígenas, considerados com força de lei perante as instituições estaduais de cada território.Enfim, o meu Pai rejubilou com o que ouviu, pois fartava-se de clamar contra a administração colonial concretizada por sucessivas governantes e confidenciou ao seu amigo Lopes Alves que talvez estivesse ali alguém que, para bem do País, concretizasse a política colonial dos Comissários Régios que, pelos vistos e para meu espanto, ambos perfilhavam. A minha Mãe pensou que alguma coisa lhe iria acontecer se continuasse a proclamar publicamente aquelas boas ideias sobre o Ultramar e a criticar a política de Assimilação levada a cabo. Mais tarde outro jantar se repetiu em casa dos meus pais, com a presença de vários amigos para conhecerem o novel Adriano Moreira.

De admirador de Adriano Moreira, converti-me em seu seguidor e a fazer propaganda da sua pessoa, no meio intelectual académico, com gente de todas as cores políticas e até proveniente de vários territórios ultramarinos, que conheciam o seu trabalho “O Problema Prisional do Ultramar”, publicado em 1953.

Pouco tempo se passou quando, para espanto da Academia de Coimbra, o homem que criticava o Estatuto do Indigenato e a Política de Assimilação foi escolhido para Ministro do Ultramar. E no exercício dessas funções, deslumbrou com o seu programa gente de todos os estratos sociais das colónias, os conhecedores da problemática africana e, principalmente, a juventude mais esclarecida do país, independente das peias impostas pela chamada situação e das movimentações políticas centradas no estrangeiro e que formalmente eram contra tudo e contra todos. Na verdade, a passagem de Adriano Moreira pelo governo, deu à Academia de Coimbra fundamentadas expectativas e inusitadas esperanças na alteração da política ultramarina até então seguida. Numa passagem sua por Coimbra, do alto dos Paços do Concelho, fez promessas radicais nos territórios coloniais, falando no Estatuto do Indigenato a que iria por cobro, e na necessidade de Estudos Gerais disseminados pelo Ultramar, nomeadamente a implantar em Luanda e em Lourenço Marques, que fundou irreversivelmente, ultrapassando todos os entraves que a própria situação lhe tentou criar..

E o nosso entusiasmo tinha razão de ser. Acabou com a Lei do Indigenato num ápice, em 1961, e as suas visitas ao Ultramar redundaram num êxito retumbante de esperança.

António Moniz Palme – 2014-10-14

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Redação Gazeta da Beira