Este texto “Algumas questões da agricultura portuguesa. A progressiva desertificação humana nas áreas de economia agrícola dominante do norte e centro do país” está subdividido em 17 pontos, pelo autor, António Bica.
Na sequência da publicação da 1ª parte deste artigo, na Gazeta da Beira nº696 de 12/05/2016 para facilitar a leitura do texto e uma vez que se trata de um artigo extenso, continuamos por mais 7 partes.
A questão da chamada soberania alimentar
Há todavia que preservar a chamada soberania alimentar, a capacidade de cada país garantir à sua população o abastecimento, em quantidade suficiente, de alimentos básicos no caso de perturbação do comércio internacional que o impeça ou dificulte.
Para isso se poder garantir é preciso que as terras com capacidade produtiva se mantenham em condições de entrar imediatamente em produção, os agricultores que as gerem tenham conhecimentos técnicos suficientes e actualizados para produzir e disponham da necessária maquinaria agrícola.
Se, além disso, cada país mantiver reserva alimentar básica permanente suficiente para alimentar a sua população durante um ano, nesse prazo é possível iniciar e concluir a produção de alimentos básicos (grãos, outros vegetais e carne de frango), para a assegurar no futuro.
A próxima reforma da PAC, se previr o pagamento aos agricultores dos bens sociais a produzir por eles que se considerar que, em cada território, de acordo com as características de solo e clima, devem ser produzidos (conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da biodiversidade, a ocupação humana e adequado emprego, que é o que se pode designar por humanização do território) garantindo-lhes condições de vida suficientemente niveladas com as da população urbana, não precisa, nem deve, atribuir-se-lhes subsídios, porque os agricultores, se produzem bens (ambientais e outros) de interesse social, devem ser remunerados por isso com justiça e não subsidiados como se fossem grupo social a viver de esmolas, ou de proprietários de terra, que, só por o serem, devam receber renda fundiária paga pelo poder público.
Essa remuneração a pagar aos agricultores pelos bens sociais que produzirem terá que ser necessariamente variável de região para região de acordo com as características de solo e de clima e dos objectivos pretendidos e contratados pelo poder público quanto a conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da paisagem, da biodiversidade e de ocupação humana, e o seu pagamento ser feito sem burocracias complexas, em tempo, ficando apenas dependente da área gerida, grande ou pequena, e da obrigatória, prévia, efectiva, isenta e atempada verificação do cumprimento dos objectivos contratados, com redução proporcional ao grau de eventual não cumprimento.
A formação e actualização profissional dos agricultores e o seu equipamento com máquinas agrícolas terá que ser objecto de adequados mecanismos de garantia e de compensação, tendo também em conta as características de cada região quanto a clima, solo e potencial uso.
Este tipo proposto de reforma da PAC garantirá que todos os agricultores, independentemente da dimensão do terreno que gerirem e sem imposição das condições que actualmente tendem a excluí-los, como são as áreas mínimas, a exigência de contabilidade organizada e semelhantes, recebam o pagamento dos serviços que com a sua actividade prestarem à comunidade.
Com isso pôr-se-á fim à actual injustiça de os subsídios agrícolas pagos pela PAC serem recebidos quase exclusivamente pelos grandes agricultores independentemente de cultivarem ou não a terra.
Estes propostos objectivos para a próxima reforma da PAC poderão garantir boa preservação do ambiente, da paisagem, da biodiversidade, das águas superficiais e subterrâneas, a ocupação e humanização do território rural, a capacidade de atrair população urbana que cada vez mais aí procura tranquilidade ou o regresso às raízes rurais familiares, antigas ou recentes, e não impedirão que cada agricultor, para além de assegurar a produção dos bens ambientais e culturais de interesse social por que for pago, produza o que entender nas terras por ele geridas, sem que por isso deva receber subsídio, garantia, ou outra compensação senão o preço que obtiver no mercado.
Essas produções tenderão a ser as economicamente mais viáveis no solo e no clima da exploração agrícola e mais facilmente colocáveis no mercado, incluindo no de proximidade (aldeia e centros urbanos próximos).
Portugal tem condições favoráveis para competir na produção de vinhos, fruta, hortícolas de estufa, azeite, madeiras para pasta de papel e cortiça e, na média distância (Portugal e Espanha), com leite e carne, passando a ser de maior interesse as produções segundo técnicas de preservação ambiental.
A PAC não poderá deixar de apoiar investimentos no meio rural para melhorar as condições de vida nele e potenciar a capacidade de atracção de gente urbana para aí se fixar e de visitantes.
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