Reflexões sobre a vida e mundo (9)
O universo de que somos parte (9)
Reflexões do falecido José Pereira sobre a vida e o mundo em manuscrito que me foi confiado
A agregação entre os seres ou realidades do universo
A agregação entre os seres (ou realidades) do universo, até aos mais densos e aos mais complexos, resultará de os componentes mais simples do universo certamente corresponderem ao que pode designar-se campos de forças, atraindo-se (para formar outros mais complexos), ou repelindo-se. Da progressiva agregação dos seres ou realidades mais simples resultarão seres cada vez mais complexos até aos chamados átomos correspondentes à Tabela Periódica de Mendeleieve, e depois, a partir daí, aos corpos cada vez mais densos e complexos que constituem as galáxias. As forças que hoje se considera ser agregadoras da matéria são as designadas gravitacional, electromagnética, nuclear fraca (estas duas actualmente agregadas na chamada força electrofraca) e nuclear forte. Mas a agregação da matéria abaixo dos quarks, dos electrões e dos neutrinos será feita por outras forças não conhecidas que se procura conhecer nos laboratórios CERN e no Fermilab; e certamente, no futuro, em outros mais poderosos.
A capacidade de atracção entre todos os seres ou realidades do universo pelas forças que os agregam é o que permitirá a progressiva densificação e complexificação deles. Assim cada ser interage, organizando-se, com outros como se cada um fosse capaz de escolher a organização com outro que mais lhe convém. A densificação e complexificação da matéria integrada pelos seres ou realidades abaixo dos átomos, a designada subatómica, processa-se segundo constantes (leis físicas) aparentemente diferentes da constituída pelos átomos e a agregação deles, embora certamente se venha a poder determinar leis físicas comuns aos dois níveis de organização da matéria. A organização acima da matéria constituída pelos átomos e pela agregação deles é a que corresponde à dos elementos químicos da Tabela Periódica de Mendeleieve. Nos graus mais elevados de complexificação a capacidade de interacção e organização com outros seres possibilita, nos mais complexos que chamamos vivos, agrupar-se em espécies com capacidade de reprodução e posteriormente de reprodução sexuada, e de organização em colectivos para melhor defesa (cardumes, rebanhos, manadas, alcateias, grupos, tribos, Estados, etc.)
Pelo que se observa, pode admitir-se que a capacidade de interacção entre seres mais simples, dando origem a outros mais complexos, resultará de afinidades que levam a que cada um se organize de certa ou certas formas com outro ou outros e não de diferente modo, o que resultará de múltiplas agregações ocasionais, como que tentativas, sempre substituídas por outras que se revelarem mais ajustadas ao longo da infinitude do tempo. É como se cada ser ou realidade tivesse capacidade de escolha segundo o que mais lhe convém, isto é de se agregar a outro (ou outros) da forma mais adequada para ambos nas concretas condições de meio ambiente, sobretudo temperatura e pressão, como peça de lego que só em posição certa o integra de forma estável. Os integrantes do que designamos átomos (que desde há cerca de um século se sabe serem decomponíveis) de modo semelhante se terão agregado como que por tentativas com correcção das menos acertadas ao longo do tempo sem fim. Para a permanente evolução do universo concorrem o acaso e a infinitude do tempo com permanente substituição da organização de cada ser por outra que se revele mais ajustada nas concretas condições ambientais.
Em todo o universo observável, pelo que se verifica pela análise espectral da radiação dele proveniente detectável na Terra, existem os mesmos componentes da tabela periódica de Mendeleieve que estão presentes no sistema solar, resultando necessariamente da agregação de iguais componentes básicos segundo as mesmas leis físicas. A relação entre os seres ou realidades do universo, pelo que se observa, processa-se segundo constantes designadas leis naturais. Essas constantes são expressáveis por método descritivo que chamamos matemática.
Da capacidade de cada ser se organizar com outro ou outros resultará a de optar pela relação organizacional que lhe é mais adequada. À medida que os seres se complexificam, adquirindo capacidade de incorporar matéria do ambiente que os rodeia e de se replicar, reproduzindo-se, podem alguns adquirir capacidade emocional e depois progressivamente capacidade de interligação de factos sentidos (observados) até chegar a capacidade de raciocinar em abstracto, isto é de figurar hipóteses e de as interrelacionar, que designamos inteligência abstracta, e de ter consciência de si.
O ser humano, que na Terra terá melhor capacidade de raciocinar em abstracto e consequentemente maior consciência de si, é capaz não apenas de optar pelo que mais lhe convém quando posto perante questão concreta que o obriga a escolher, como manifestamente fazem todos os seres vivos, mas também de figurar (prever) questão antes de ela concretamente se lhe pôr e as consequências previsíveis das escolhas possíveis (o que poderemos designar por engenharia de raciocínios) para lhe dar solução de modo a poder optar pela considerada melhor quando a questão concreta se lhe vier a pôr, ou experimentando-as, podendo, para chegar ao melhor resultado, figurar para a solução o uso de instrumentos.
Esta possibilidade dos seres humanos figurarem questões e soluções imaginadas para elas é o que se pode designar capacidade de raciocínio abstracto. É capacidade de raciocinar sobre questão hipotética, isto é sobre questão imaginada. Torna possível procurar entender tudo o que nos rodeia, criar instrumentos para reduzir o esforço de produção do que se afigura útil à existência dos humanos e cada humano ter elevada consciência de si. A capacidade de raciocinar em abstracto não é exclusiva dos humanos. Há primatas e outros animais com capacidade semelhante, embora de grau aparentemente muito mais reduzido, que lhes possibilita nomeadamente produzir e usar instrumentos para mais facilmente obter alimentos e abrigo ou melhor interagir com outros, sem que isso seja atribuível a condicionamento genético, porque nem todos os grupos da mesma espécie revelam igual comportamento.
NOTA: A transcrição do escrito pelo falecido José Pereira foi autorizada pela família.Redação Gazeta da Beira
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