M. Guimarães da Rocha (Ed. 671)

BUTAR PULHAS EM SÃO PEDRO DO SUL

(sinonimo de pulha:-canalhice, biltre, cafajeste, mentira, marau, malandro, mariola, patife, safardana, logro, desprovido de dignidade, troça)

Nestas curtas férias de “Carnaval” tive a honra de um convite irrecusável, de um grande amigo, para passar esses dias, na sua “Quinta da Basteira”, em Povolide (Viseu). Foram uns dias agradáveis, que nem o frio incomodativo e a chuva persistente, conseguiram incomodar.

O tempo não estava propriamente convidativo a passeios pedrestes, mas umas viagens rápidas a Viseu, trouxeram-me à mente as vivências aí passadas, o exame de admissão aos Liceus, a matrícula no velho “Liceu Alves Martins “e a mudança para as actuais instalações, com cortejo e, tudo mais que a inovação impunha. Tudo conduzido, orientado e, muito bem organizado, pelos mais velhos e, por mão invisível, nesses momentos sempre presente. Foram umas festas plenas de intencionalidade e graça que ainda hoje, sessenta e oito anos depois, recordo duma forma muito viva e próxima.

Por razões ocasionais, que não pude evitar, não consegui ir visitar São Pedro do Sul, como era meu desejo, mas ainda houve ocasião para ir a Oliveira de Frades, comer no restaurante “O Solar”, uma deliciosa “vitela assada no forno á moda de Lafões“, que estava de se lhe “tirar o chapéu”!

Aí conversei animadamente com os meus amigos de infância, sobre as esperadas festividades carnavalescas locais, e fiquei informado que, em São Pedro parece que só nos resta uma resiliência férrea e boa disposição de Negrelos para dar animação à quadra do Entrudo.

As festividades Carnavalescas, nunca foram, no meu tempo, de grande exuberância na zona, mas havia um acontecimento que há muitos anos acontecia e, eu não estou seguro se era pelo Entrudo (?), se era pela “Micarem”(?) ou pela “quinta- feira das Comadres”(?) ou pela “quarta feira dos Compadres”(?)… Não sei e não consegui ninguém que me informasse com segurança. Procurei mesmo esclarecer-me em alguns alfarrábios e, na Internet, mas não obtive  informação segura sobre o assunto! Fico no entanto com pendor certeiro, para a terça-feira de carnaval.

Estou certo e confiante, de que ALGUÉM DA NOSSA QUERIDA REGIÃO DE LAFÕES, quer nas Cidades e Vilas, quer principalmente nas Aldeias com maior número de habitantes, saberá. A todos peço a melhor colaboração, quer através do meu Mail ou carta para a Gazeta. Penso que seria importante mesmo, fazer a história desta “moda,” na ocasião desejada por uns e odiada por outros e, que não passava de  uma manifestação de rebeldia medieval.

Trata-se, com já todos perceberam, do hábito medieval de “BUTAR PULHAS”!

Pulhas, tradições de Carnaval, também conhecidas em certos lugares do País por “PASSAJOLAS”. Seriam uma espécie de sátiras e provocações humorísticas, por vezes ofensivas. “Justiça medieval de má-língua” subversão momentânea da ordem normal e, certamente em muitos casos semeadas de “más intenções”. Era talvez o manter da rebeldia duma sociedade, apertada entre regras rigorosíssimas da moral e a ética medieval, que todos sentiam balofas e protectoras duma elite dominante.

Comemoração primitiva entre os dois ciclos – o do Inverno e o da Primavera.

Era considerado um “divertimento carnavalesco”, mal aceite pelas autoridades civis e religiosas, com seria de esperar! Não sei se a legislação proibía tais práticas, nem quais seriam as consequências para os que fossem apanhados, mas imagino que não deveriam ser meigas!

Algum dos muitos conhecidos e prestigiados juristas, conterrâneos ou não, que na nossa região habitam, me saberá informar se houve legislação sobre este assunto? Eu ficaria muito grato pela informação e pela indicação da respectiva fonte. E, a existir, se ainda está em vigor, como o imposto de selo do tempo da “invencível armada”?

Actualmente aparece-nos contada, como um divertimento carnavalesco, usual nas zonas mais montanhosas, onde condições naturais da existência de pequenos morros no perímetro das povoações, permitiriam fácil propagação sonora das mensagens.

Estas eram lançadas por pequenos grupos de duas ou três pessoas, usando como amplificadores de voz os “CABAÇOS” secos no Verão, ou os funis grandes, das adegas.

Era uma subversão momentânea da ordem normal, com certos excessos alguma licenciosidade, quase sempre feitas em versos, sem nunca nomear o nome dos visados, mas não deixando, aos que as escutavam, qualquer dúvida a quem eram dirigidas.

Com o fim de desencorajar a sua perseguição, disparavam tiros com os bacamartes, gritando antes:- companheiro da direita, fogo! E logo saía fogo. Depois mandava o companheiro da esquerda, embora fossem somente dois ou três, mas de noite, no pinhal, dissuadia a tomar qualquer atitude, mesmo ao mais ousado.

Já os dias das comadres e dos compadres não passariam de rituais de glorificação do grupo sexual.

“Há quem afirme, que esta tradição ainda tem laivos de actualidade folclórica em algumas aldeias da Beira e Trás-os-Montes, com por exemplo em Lazarim – Lamego, festas a que nunca assisti.

Lembro-me que quando frequentava a escola primária da Negrosa, ser voz corrente que os pulhas actuavam em Saínhas, por cima de Negrelos, mas não me recorda de alguma vez os ter ouvido a actuar na noite de segunda para terça-feira de Carnaval.

Claro que já ouvi muitas pulhas, algumas bem “botadas” e assertivas, principalmente sobre a actualidade política vigente, sem se esconderem nos montes, mas utilizando a radiodifusão e a televisão, com muitos assistentes a aplaudir e grandes amplificadores electrónicos… mas isso são contas de outro rosário!

Muitos autores afirmam que o carnaval do Rio de Janeiro foi levado pelos Portugueses que, em Lisboa e Arredores participavam nas “CEGADAS”, que se mantiveram em grande parte do século XX, com um caracter vincadamente popular. Ainda hoje se usa a expressão “isto é uma cegada“, na linguagem corrente do Lisboeta.

No Rio de Janeiro é hoje o maior espectáculo do Mundo, com desfiles estonteantes de luxo e beleza, que encantam todos os espectadores “in loco” e na televisão de todos os canais do mundo inteiro.

Por vezes no desfile de Sapucaí, lê-se uma ou outra frase crítica á sociedade e á política, mas sem a agressividade dos “pulhas dos séculos passados”, talvez fruto do “açúcar” aceite pelos organizadores, possivelmente com intuito de amenizar os festejos de Carnaval no Rio de Janeiro.

Enfim, hoje ninguém mais “bota pulhas”, adaptam-se á realidade em críticas de filosofia política mais ou menos convincente, sempre escondidos atrás duma folha de EXCEL e, amparados numa opinião jurídica abalizada. Parece que há medo, que de outra forma os Germânicos possam reparar e, ficar de mau humor!

Nada receiem, pois os Gregos nem necessitaram de dar tiros para o ar com os seus bacamartes e, bastou uma linguagem firme, para que toda a EUROPA SE “STRIPASSE”.

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Redação Gazeta da Beira