Continuam os “escândalos” do… Ecos do Vouga

A Imprensa Regional de Lafões na 1ª República

• Norberto Gomes da Costa (norberto.g.costa@sapo.pt)
Crónica 14/11/2013 (Ed. 642)

Continuam os “escândalos” do… Ecos do Vouga

Só quem não estiver familiarizado com o tom hostil e agressivo posto em prática pela Imprensa, contra as instituições, os partidos políticos e  os grupos de cidadãos que não se situem na órbita do seu pensamento ou da sua simpatia, praticamente desde meados do século XIX, ainda durante o consulado monárquico, até, pelo menos, ao fim da 1ª república, é que estranha o tipo de postura do jornal Ecos do Vouga, perante os seus adversários políticos.

Acompanho muito de perto, como disse, a acção das publicações, nomeadamente da Imprensa Regional de Lafões desde o Ultimato Inglês, nas últimas duas décadas  da Monarquia,  até ao activíssimo jornalismo republicano e constato que o estilo provocatório e, às vezes,  pouco rigoroso, muito incisivo, com um tipo de linguagem que hoje, excluindo alguma comunicação social conotada com os partidos da extrema esquerda, já não se usa, faziam parte do então paradigma em vigor.

Quer os periódicos monárquicos afectos aos Partidos Regenerador e Progressista, quer os conotados com o Partido Republicano Português, nalguns casos duas décadas depois, afinam, efectivamente, pelo mesmo diapasão, acima sintetizado e excelentemente retratado pelo semanário sampedrense, que tem sido e continuará a ser, por mim, analisado.

Para acompanharmos então as diatribes do Ecos do Vouga contra o executivo da Câmara de S. Pedro Sul, adverso da política defendida pelo semanário, iremos ver que o tema em questão é o mesmo,  a postura frontal e acutilante não difere muito da dos últimos números.

Em 11 de Maio de 1914, com o titulo “NO IMPERIO DO ESCANDALO”  e subtítulo “INSACIAVEIS”, escrevia o jornal: “Fez alarme, no publico, o artigo, sob esta epígrafe publicado, neste lugar, no ultimo numero do nosso jornal.

Mesmo, dos amigos do dr. Ferreira, aqueles que mais intimamente, com êle, convivem acharam extraordinaria a audacia com que êste funesto personagem aproveita os dinheiros publicos para repugnantes negociatas de particulares, que supõem serem os cofres municipais alguma mesa improvisada de ciganos de feira.

O homem tem porém a sorte que merece. Quis subir muito, precipitou-se na descida e cai miseravelmente, por todos condenado, no maximo isolamento moral. O heroi de Marengo liquidou em Santa Helena; as aguias da França imperial quebraram-se de encontro aos penhascos do Bussaco. Mas, estamos delirando, o homem não vale os paralelos. O sr. Ferreira de Almeida é um quixote  em miniatura: fumaças de mandante, que se cifram no ridiculo do seu ajudante de campo – o boticario Jorge, decantado em todas as revistas humoristicas deste infeliz Portugal.

Usando, um pouco, o sistema jusuitico, recolheu-se ao silencio, sempre que lhe convem.

Hoje, mais que nunca, o homem está mudo, como que alquebrado e sem forças…..”

E ainda: “…..Viu o publico para que serviu o ultimo emprestimo municipal de 12 contos: – construção de avenidas, que só favorecem particulares;  estudos e mais estudos, a sustentação dum engenheiro que põe a sua autoridade profissional à mercê dos caprichos do sr. Ferreira: arrematação em que se faz jogo de ciganos; em suma, uma barafunda dos infernos, que irrita toda a gente e está já provocando nauseas.

Não, isto não pode continuar e não continuará.

É preciso que a justiça intervenha……”

E termina: “……Por virtude de tudo isto, ousamos pedir, a quem de direito agora compete, a intervenção indispensavel, para que o sr. dr. Ferreira e companheiros da Camara Municipal sejam detidos na obra funesta, que está irritando todo um concelho, digno de melhor sorte.

Siga o processo  de sindicancia.

Sindicancia!…Sindicancia!..

V I V A   A    R E P U B L I C A!.”

À primeira vista, salvaguardando as circunstâncias de não conhecer em profundidade o problema em questão, já que o jornal não nos dá um retrato fiel do que se estava a passar, diria que se trata de uma questiúncula político-partidária, como as que, passados cem anos, nos entram, todos os dias, pela casa dentro.

Há um lançamento de duas obras importantes para S. Pedro do Sul e para as suas  Termas; adjudica-se as empreitadas a um determinado construtor; pede-se um empréstimo para satisfazer esses encargos. Aparentemente, tudo normal, não obstante o burburinho que à volta destes assuntos sempre se fez e, pelos vistos, sempre se fará, enquanto houver democracia (democracia limitada, na Monarquia Parlamentar e na República, como se sabe), partidos políticos, distintos modos de olhar a vida e diferentes projectos para a sociedade.

——————————————————————————————————————

Mais artigos

Os “escândalos”  do… Ecos do Vouga (Ed. 641 – 24/10/2013)
Como a Imprensa Republicana endeusava Afonso Costa (Ed. 640 – 10/10/2013)
O Ecos do Vouga não desarma em defesa de Afonso Costa (Ed. 639 – 26/09/2013)