Os fogos deste verão obrigam o país a tomar medidas de reorganização da floresta nas regiões de pequena e média propriedade como é a de Lafões

António Bica

21-08_Baldios-Comunicado

A floresta ocupa grande parte da superfície do país continental, cerca de 3,16 milhões de hectares dos 8,9 milhões da sua área total, o que corresponde aproximadamente a 35,5% da superfície. A restante área do país continental, cerca de 2,84 milhões de hectares, é ocupada por matos e pastagens (cerca de 32%), sendo aproximadamente 1,97 milhões de hectares de matos susceptíveis de produzir floresta, e ocupada por actividades agrícolas (cerca de 24%), o restante, (9%), por áreas urbanizadas (5%), águas interiores (2%) e solos improdutivos (2%). Na área de floresta é incluída a destruída por fogos com anterior ocupação florestal, admitindo-se que venha a prazo não longo a ter uso florestal por regeneração natural ou repovoamento.

De 1995 a 2010 a área a floresta decresceu de 3,305 para 3,154 milhões de hectares, com perda de cerca de 151 mil hectares, o que se deveu principalmente à destruição por fogo sem repovoamento em prazo razoável.

No mesmo período (de 1995 a 2010) decresceu a área agrícola que passou de 2,407 para 2,114 milhões de hectares, com redução de 293 mil hectares.

Os incêndios florestais são o maior flagelo da cultura florestal no país continental. De 1990 a 2012 foram destruídos pelo fogo 2,5 milhões de hectares de floresta, dos quais parte significativa não foi reflorestada em prazo razoável. A redução da área a floresta teve maior peso no norte e centro do país (norte do rio Tejo) e na serra algarvia.

O significativo decréscimo da área agrícola de 1995 para 2010 resultou de abandono das culturas agrícolas com passagem a mato, usado em algumas regiões para pastoreio extensivo, frequentemente por quem não é dono dos prédios correspondentes. Os matos situam-se principalmente nas zonas de serra onde domina a pequena e média propriedade.

Da floresta (3,16 milhões de hectares) cerca de 812 mil hectares é de eucaliptos, de sobreiros cerca de 737 mil hectares, de pinheiros bravos cerca de 714 mil hectares, de azinheiras cerca de 412 mil hectares, de carvalhos cerca de 150 mil hectares, de pinheiros mansos cerca de 130 mil hectares, de castanheiros cerca de 30 mil hectares, e o restante de outro arvoredo. A tendência tem sido de redução gradual da área de pinheiro bravo, que passou de 1.252 mil hectares na década de 1980 para 885 mil hectares em 2006, sendo actualmente de cerca de 714 mil hectares sobretudo em consequência do maior interesse económico do eucalipto.

A espécie florestal com maior progressão é o eucalipto, que passou de cerca de 241 mil hectares na década de 1970 para 740 mil hectares em 2006 e recentemente para cerca de 812 mil hectares.

A área a sobreiros evoluiu, em números aproximados, de 657 mil hectares na década de 1970 para 716 mil hectares em 2006 e 737 mil hectares recentemente.

Também o pinheiro manso progrediu significativamente em área, passando de cerca de 50 mil hectares na década de 1970 para cerca de 130 mil hectares em 2006.

Os carvalhos passaram de cerca de 71 mil hectares na década de 1970 para cerca de 150 mil hectares em 2006.

A significativa redução da área ocupada por pinheiro bravo deve-se à sua menor resistência aos fogos florestais, a ser atacado pelo nemátodo (bursaphelenchus xylophilus) e por ter menor interesse económico que o eucalipto.

O aumento da superfície plantada a eucaliptos resulta do preço da sua madeira, da boa produtividade em madeira, da precocidade da entrada em produção (cerca de 10 a 12 anos após a plantação) e da não excessiva rotação da produção (cerca de 10 a 12 anos).

O alargamento da plantação dos sobreiros deve-se ao bom preço da cortiça, da rotação da produção (9 a 10 anos), apesar de a sua entrada em produção demorar cerca de 30 anos, o que é compensado por no sobcoberto dos sobreiros se produzir pastagem para gado, incluindo porcos de montanheira, enquanto que no sobcoberto dos eucaliptos em monocultura não se desenvolve vegetação relevante.

O aumento da área do pinheiro manso tem também origem em razões económicas. A rotação da produção é anual após os pinheiros começarem a frutificar, o que actualmente se é em prazo não longo, e as pinhas são pagas a preços compensadores.

A política florestal terá que ter em conta a economia global da floresta, havendo que ser compatibilizada com outros fins, que se indicam por ordem de importância: fixação e preservação dos solos; fixação de carbono atmosférico compensador da queima de combustíveis fósseis em quantidades que excedem actualmente muito a conversão em matéria orgânica por fotossíntese do dióxido de carbono; compatibilização com a produção de gado sobretudo pequenos ruminantes; preservação das espécies endógenas em função do clima e do solo de cada região por serem as que melhor convivem com as plantas arbustivas espontâneas e as herbáceas que possibilitam a vida animal selvagem; preservação de espécies vegetais e animais em risco de excessiva redução ou extinção para assegurar a biodiversidade; produção de paisagem capaz de atrair população urbana às zonas rurais contrariando o seu despovoamento.

O quadro legal a regular a produção florestal deverá ter em conta os objectivos referidos, procurando-se que as medidas para os prosseguir se harmonizem com os direitos e os interesses das populações locais, incluindo nas largas áreas do país em que domina a pequena e média propriedade agrícola, florestal e a mato (toda a parte ao norte do Tejo e a serra do Algarve). E deverá ser de cumprimento tão desburocratizado quanto possível, com participação dos serviços municipais e os de freguesia, tendo em conta a sua proximidade com o população local, e o que estiver previsto quanto ao espaço rural florestal e a florestar no plano director municipal correspondente.

Os eucaliptos, incluindo o globulus, o mais cultivado em Portugal, que são originários de regiões pouco pluviosas da Austrália, procuram pelo seu sistema radicular de superfície humidade na camada superficial do solo, dificultando o desenvolvimento das plantas arbustivas e das herbáceas no sobcoberto do arvoredo. As suas raízes profundantes, onde encontram no subsolo fenda em que passe água, desenvolvem radículas densas a impedi-la de passar, o que tende a fazer secar nascentes próximas, não porque as raízes absorvam toda a água, mas por impedirem a sua circulação, desviando-a do curso normal.

Desta característica dos eucaliptos, incluindo o glóbulos, a espécie dominante em Portugal, resulta a ideia generalizada de que são grandes consumidores de água, o que não corresponde à realidade. Se os eucaliptos fossem grandes consumidores de água, as suas folhas perdê-la-iam por evapotranspiração e consequentemente a sua sombra seria fresca, como é a dos castanheiros e a dos carvalhos, o que não acontece. Por os eucaliptos terem estas características, já em 1937, pela lei 1951 de 9 de Março, e pelos decretos-lei 28.038 e 28.040 foi proibida a plantação e a sementeira de eucaliptos a menos de 20 metros de terrenos cultivados e de 30 metros de nascentes, de terras de cultura de regadio, de muros e de prédios urbanos, estendendo-se essa proibição às acácias mimosas (acacia dealbata) e aos ailantos (ailanthus altissima). Esta legislação, que esteve em vigor até 2013, foi injustificadamente revogada pelo decreto-lei 96/2013 de 19 de Julho.

Estas espécies florestais exóticas e outras foram gradualmente introduzidas no país nos séculos 18 e 19 com o desenvolvimento da classificação das espécies e a criação de arboretos de recreio junto a palácios, a casas apalaçadas e às residências dos mais ricos.

Com a construção dos caminhos de ferro e das estradas no século 19 essas espécies florestais foram largamente usadas para fixar taludes das vias, tendo-se preferido por serem para esse efeito eficazes, sobretudo porque algumas se propagam por rebentos do seu sistema radicular superficial, como as mimosas (acacia dealbata), muitas das outras acácias, a espinhosa (robinia pseudoacacia) e os ailantos.

Estas espécies arbóreas são causadoras de prejuízo significativo nos prédios por que cada vez mais se expandem, havendo devendo a lei proibir a sua plantação ou sementeira e prever a erradicação delas na proximidade de prédios de terceiros e nas bermas das vias públicas. No Parque Natural da Peneda-Gerês, donde deveriam ter sido já erradicada as mimosas, elas estão a dominar o terreno em largas manchas de solo que cada vez mais se expandem.

Recentemente, em 2013, como se referiu, pelo decreto-lei 96/2013 de 19 de Julho, foi revogada essa legislação de 1937 sem que pelo diploma se tivessem criado normas preventivas dos efeitos prejudiciais dessas plantas e outras às culturas agrícolas, às nascentes de água, à floresta, à biodiversidade animal e vegetal e às construções próximas.

O decreto-lei 96/2013 também não teve o cuidado de harmonizar o seu articulado com o decreto-lei 565/99 de 21 de Dezembro que regula a introdução na natureza de espécies não indígenas de fauna e flora assinaladas no anexo I de que consta a indicação “(I) – invasora”, se o são, e, tendo risco ecológico, no anexo III.

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