Mário Pereira

Eu sei. Fui eu que fiz!

Ed660_NovoBancoEm Portugal estamos num tempo em que é uma raridade ouvir alguém dizer algo parecido com o título desta crónica.

Desde o mais simples funcionário, que nos responde que se limita a fazer o que lhe mandam, até ao Presidente da República quando acossado por um advogado sobre o seu papel na história do BES, publicou um comunicado a dizer que não sabia de nada e se limitou a repetir o que o Governador do Banco de Portugal havia dito.

A cereja em cima do bolo foi a entrevista ao Jornal I de um importante advogado que durante seis anos foi administrador não executivo do BES, se seu nome Nuno Godinho de Matos.

Assume que ia a cinco ou seis reuniões por ano e que por cada um delas recebia líquido 2400 euros, mas em nenhuma das reuniões abriu a boca para perguntar o que quer que fosse.

Acrescentando ainda que a culpa disso ser assim e do que se passou no BES é do Banco de Portugal. Pelos vistos só lhe pagavam para enfeitar uma jarra e não para fazer perguntas ou ver coisas incómodas.

Se lermos e ouvirmos declarações sobre a gestão do Grupo Espírito Santo não se encontra uma pessoa que não diga que não sabia de nada e que não tinha nada a ver com a gestão do grupo e do banco.

Quando se descobriu uma falcatrua nas contas de uma sociedade do Grupo Espírito Santo (faltava registar cerca de mil e duzentos milhões de dívidas), o próprio Dr. Ricardo Salgado apressou-se a dizer que não sabia de nada e se havia problemas o culpado era o contabilista.

A PT conseguiu emprestar cerca de mil milhões de euros ao Grupo Espírito Santo sem que se soubesse quem tomou a decisão.

O actual Governador do Banco, quando inquirido, em processos relacionados com a sua actividade no BCP, conseguiu dizer que não se lembrava de nada e que deveria ter sido algum funcionário a fazer as sociedades offshore sem ele dar conta.

Eu começo a pensar que a diferença entre o sucateiro Manuel Godinho e o Grupo Espírito Santo e muitas sociedades e empresas finas é que o Manuel Godinho tinha que dar umas caixas de robalos e uns presentes pelo Natal, mas os finos podem oferecer lugares de administradores, membros das mesas das assembleias-gerais, conselhos fiscais e pagar uns pareceres.

Como se está a ver uns e outros pagaram para que muitas pessoas fingisses serem surdas, cegas e mudas e os negócios se pudessem fazer como usual.

O título desta crónica é “rapinado” de uma história verídica, em que fui parte, a qual demonstra que assumir responsabilidades é uma questão de carácter e de personalidade e não de inteligência ou de conhecimentos académicos.

A história tem mais de trinta anos, ainda eu não trabalhava nem vivia na nossa região.

Então, eu trabalhava num organização que apoiava, ainda hoje apoia, pessoas com deficiência e entre as quais  havia um jovem com cerca de 20 anos, portador de uma deficiência mental grave, causada pela doença, vulgarmente, conhecida por mongolismo.

Este rapaz tinha desenvolvido uma enorme paixão por uma técnica da equipa, ao ponto de me pedirem, na qualidade de psicólogo, para falar com ele.

Lá conversei com ele e tentei explicar-lhe, que era melhor ele apaixonar-se por outra rapariga porque aquela já era casada e além disso estava grávida.

A sua resposta foi rápida e directa:

Eu sei. Fui eu que fiz!Redação Gazeta da Beira

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