Manuel Silva

Encontros e desencontros com Mário Soares (parte 1)

Todos os portugueses tiveram encontros e desencontros com Mário Soares ao longo dos últimos 43 anos. Quem foi e é socialista, naturalmente votou sempre em Mário Soares e no PS quando o mesmo era seu líder. Entre os outros portugueses, poucos haverá que não tenham votado, pelo menos uma vez, no ex-PR agora falecido e contra ele, porque Mário Soares era uma pessoa de consensos quanto a questões fundamentais de regime e no tocante à concertação social, mas controverso na luta política com os seus adversários. Até por isso é um dos símbolos máximos da democracia em Portugal.

A democracia implica acordos quanto às regras do jogo político e divergências na  organização e governação da sociedade. Por isso existem partidos com programas e ideologias diferentes. Também por isso a democracia da UE, ao impôr políticas únicas, é meramente formal. No que ao nosso país diz respeito, para União Nacional chegou a outra, que durou meio século.

Filho do ex-ministro da 1ª República e lutador anti-salazarista João Soares, Mário Soares bem jovem começa a fazer política. Em meados dos anos 40 do século passado, adere ao MUD (Movimento de Unidade Democrática) e, mais tarde, ao Partido Comunista Português (PCP), no qual era conhecido pelo pseudónimo de “Fontes”. Entre os jovens oprimidos daquela época não se discutia quem era comunista, mas quem não era.         Bem cedo, no final dos anos 40/princípios de 50, os crimes de Estaline e toda a organização totalitária e concentracionária da URSS e demais países socialistas do leste europeu fazem Soares reflectir e abandonar o PCP, o qual o criticou violentamente.

Posteriormente, Mário Soares adere à ideologia socialista democrática, tendo fundado e dirigido várias organizações situadas naquela área. A penúltima foi a ASP (Acção Socialista Portuguesa), que em Abril de 1973 deu origem ao actual PS.

Soares foi dos opositores mais perseguidos pela polícia política da ditadura, a PIDE. Esteve várias vezes preso, foi deportado para S. Tomé e Príncipe e mais tarde exilou-se em França, onde estava no 25 de Abril, sendo já o secretário-geral do Partido Socialista. Denunciou a hipocrisia moralista de pelo menos um ministro e vários membros importantes do regime de Salazar que se envolveram, na segunda metade da década de sessenta, num caso de pedofilia tentado abafar pela PIDE, o qual ficou conhecido como “Ballet Rose”.

Quando chegou do exílio, a sua luta era pela defesa da liberdade conquistada e a construção de uma sociedade socialista, democrática e pluralista. A parte económica do programa do PS punha grande ênfase na estatização dos meios de produção, na senda de partidos como o Trabalhista Britânico.

Cedo se apercebe, pelo comportamento do PCP, que este quer instaurar um regime totalitário no nosso país, no que contava com forte apoio no MFA. Ao lado de Sá Carneiro, Freitas do Amaral e dos militares de Abril moderados combate o seu antigo partido e os seus satélites, entre os quais pontificava o MDP/CDE. Aquelas personalidades e forças e ainda organizações maoistas como o MRPP, o PCP(m-l), a UCRP(m-l) e a OCMLP – os três últimos há muito desaparecidos – saem vencedoras no 25 de Novembro de 1975.

O 25 de Novembro foi o golpe nas aspirações de então do PCP e o retomar do espírito original do 25 de Abril.

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