Manuel Silva

De libertador a ditador

 

Nos anos 50 do século passado, o povo cubano vivia miseravelmente sob uma férrea ditadura fascista, chefiada por Fulgêncio Batista. A riqueza do país estava concentrada nas mãos do corrupto e ladrão Batista e seus amigos. Além disso, Cuba era um pro707_manuelsilva_fidelstíbulo dos EUA. Tinha que haver uma revolução em Cuba!

O então jovem advogado Fidel Castro distinguiu-se na luta contra aquela tirania. Com o médico argentino Ernesto “Ché” Guevara e alguns, não muitos, “jovens barbudos”, desencadearam uma luta de guerrilha contra o regime de Fulgêncio Batista, o qual derrubaram no dia 1 de Janeiro de 1959.

Foi uma das revoluções mais românticas da História, a qual despertou enorme fervor revolucionário nos corações da juventude da época, especialmente na América Latina, então praticamente toda submetida a ditaduras militares de direita, corruptas e cleptocráticas. Os democratas do mundo inteiro identificavam-se com os “barbudos”.

Fidel Castro era um libertador que prometeu um regime pluralista, com eleições livres, em Cuba. No entanto, passado pouco tempo aquele país caía num regime marxista de partido único, ou seja, numa ditadura de sinal contrário, sem liberdade de expressão, de reunião, de associação, de manifestação, de exercício de oposição, sendo fuzilados muitos milhares de cubanos, contando-se entre estes imensos que desceram a Sierra Mestra com Fidel e Ché Guevara. Foram criados campos de concentração e prisões políticas onde os prisioneiros (de consciência) passaram a ser maltratados e torturados.

No plano social, a Revolução trouxe um grande progresso a Cuba, especialmente na educação, na cultura e na saúde, bens a que os cubanos têm acesso gratuito. O serviço nacional de saúde cubano é dos melhores do mundo. No entanto, Cuba é um dos países mais pobres da América Latina. Como é costume dizer-se, o problema dos seus habitantes é o pequeno almoço, o almoço e o jantar.

As imagens televisivas de Havana mostram uma cidade degradada.

Se alguma sociedade mostra a falência do modelo comunista é Cuba.

Um dos ícones dos partidos comunistas, em tempos idos filo-soviéticos, é Ché Guevara, que também não é o revolucionário idealista que muita gente pensa. Tal como Fidel Castro, foi um dos libertadores da ditadura de Batista, mas também um dos grandes responsáveis pela instauração da ditadura comunista. Assinou muitas centenas de sentenças de morte, a começar por camaradas guerrilheiros não comunistas, que queriam ver uma autêntica democracia em Cuba. Ché afirmava: “na dúvida, mato”.

Ché Guevara foi governador do Banco de Cuba e ministro da Indústria, tendo em ambos os cargos primado pela incompetência. Cedo abandonou aquele país, passando a chefiar grupos de guerrilha que iriam “libertar os explorados e oprimidos de outros países”. Primeiro, tais grupos combateram em África, tendo a sua experiência sido muito negativa. Posteriormente, partiram para a Bolívia, onde Guevara foi morto no dia 9 de Outubro de 1967, “à frente de um levantamento de camponeses”, segundo os seus simpatizantes. Só que os camponeses nada tinham a ver com a luta de Guevara e seus camaradas.

Em Portugal, no pós-25 de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho procurou imitar Fidel e Ché, criando aqui a Cuba da Europa. Foi o cérebro da Revolução do 25 de Abril. Esta dívida têm para com ele todos os amantes da liberdade e da democracia. Pouco depois daquela data fez uma viagem à Suécia, vindo deste país a elogiar a social-democracia. Ingénuo e muito mal formado politicamente, acabou por se deixar usar como porta-estandarte por intelectuais e estudantes de extrema-esquerda, a maioria dos quais está hoje no PS e no PSD, escrevendo alguns no “Observador”, o porta-voz intelectual da nova direita liberal, conservadora e avessa à justiça social. Derrotado no 25 de Novembro de 1975, afastado consequentemente das Forças Armadas, continuou ligado à esquerda radical, sendo, nos anos 1980, acusado de liderar a organização terrorista FP 25 (Forças Populares 25 de Abril) e, consequentemente, condenado na pena de 18 anos de prisão, a qual nunca transitou em julgado, dado o Tribunal Constitucional ter anulado o julgamento dos crimes perpetrados pelas FPs e, posteriormente os implicados no auto-proclamado “projecto global” terem sido amnistiados.

Quando foi preso por combater o fascismo de Fulgêncio Batista, Fidel Castro disse que a História o absolveria.

A História já o julgou como libertador de uma tirania e construtor de outra. Quanto a Otelo, porque nunca consolidou o poder que chegou a ter quando comandante do COPCON, a nossa História julgá-lo-á como libertador de uma ditadura, mas que posteriormente esteve sempre contra a democracia representativa, a única e verdadeira forma de democracia enquanto regime político.

Milan Kundera, Homem de esquerda e anti-comunista, aquando da ditadura marxista existente na sua Checoslováquia, afirmava ter o comunismo criado grandes problemas à construção e afirmação das outras esquerdas, mas também dizia: “a esquerda é a grande marcha da História, devendo ignorar os regimes comunistas e seguir em frente”. É exactamente isso que a esquerda, especialmente a social-democrata, terá que fazer.

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