João Fraga de Oliveira (*)

Quartel do bombeiros de Santa Cruz da Trapa

(*) Presidente da Direcção da AHBVSCT

No dia 26 de Fevereiro, foi assinado o auto de consignação da obra de ampliação e remodelação  do quartel da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Santa Cruz da Trapa (AHBVSCT).

Ao procedimento foi conferido algum significado institucional e social com a presença do sr. presidente da Câmara Municipal de São Pedro do Sul, dos srs. presidentes das Juntas de Freguesia do âmbito formal de intervenção do Corpo de Bombeiros (CB) detido pela AHBVSCT, de representantes dos Órgãos Sociais, do comando do CB e da comunicação social.

A esta expressão mais pública, esteve subjacente o facto de se tratar de uma obra que vai enriquecer a estrutura material de protecção civil não apenas local mas, também, municipal, regional e nacional.

A concretização desta obra, agora iniciada (de facto, no próprio dia da assinatura do auto de consignação), é o culminar de um processo, longo de quatro anos, prosseguido com a perseverança decorrente da sua objectiva necessidade.

De facto, as actuais instalações do quartel não tiveram qualquer melhoria desde 2005, quando, então, assumiram a presente dimensão, disposição e condições de construção.

Daí resultou uma progressiva desadequação às actuais exigências que se colocam às actividades da AHBVSCT (e muito especialmente do CB), não apenas por razões regulamentares mas, sobretudo, por razões de conforto, de segurança e de saúde dos bombeiros e trabalhadores e – ainda mais essencial – por razões de qualidade, segurança e prontidão no serviço de socorro e apoio às pessoas e na salvaguarda de bens.

De facto, tais obras, conforme o respectivo  projecto, visam incidir nas insuficiências e deficiências actuais do quartel atrás enunciadas: alargamento do parque auto (cuja exiguidade de espaço obriga, muitas vezes, a terem que sair umas viaturas só para arrumar ou saírem outras, com consequente perda de capacidade de prontidão e risco de deterioração de viaturas e equipamento) com substituição da respectiva cobertura (ainda em fibrocimento, com consequente risco de exposição a fibras de amianto, risco cuja prevenção é agora especialmente exigível por lei); disponibilização de instalações de formação, de treino e de alojamento (dormitório) e de higiene (sanitárias e de vestiário) dos bombeiros; deslocalização e melhoria das estruturas e equipamento de comunicação e de alerta indispensáveis para qualquer corpo de bombeiros.

Pelo menos desde 2014 que os actuais órgãos sociais e comando do CB têm providenciado no sentido de obterem suporte oficial e financeiro para tal obra.

Como se sabe, o enquadramento deste tipo de obras assenta essencialmente em duas entidades: primeiro, na Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), que avalia e dá um parecer do o ponto de vista da sua necessidade como valor acrescentado como estrutura material de protecção civil, decidindo também quanto à estimativa do seu valor como referência para subsequente  apoio estatal ou comunitário; em segundo lugar, na estrutura administrativo-financeira criada no Ministério da Administração Interna (MAI) para tutelar (ponderar, decidir e controlar) a atribuição, aceitação, contratualização  e execução de financiamentos decorrentes dos quadros comunitários de apoio (primeiro, o “QREN” / POVT  e, depois, actualmente, o “20-20” / POSEUR).

Neste enquadramento, a AHBVSCT candidatou-se em fins de 2014 a parecer da ANPC e a um apoio financeiro já visando, no essencial, as obras que agora se iniciaram.

Considerando que a capacidade da associação não poderia (nem deveria) ir além de tal, o critério de esforço financeiro da associação foi sempre o de ter como definição de preço-base de lançamento do inerente concurso publico (legalmente exigível por lei) o valor estimado da obra definido no parecer prévio da ANPC e pelo qual, em coerência, seria definido pelo MAI (POVT)

Contudo, apesar de aprovado o projecto pela ANPC e aprovada (ainda que num regime de overbooking) a candidatura pelo MAI / QREN / POVT, em sede de concurso público, o mercado não correspondeu com interesse na execução. Quer num primeiro concurso, quer ainda num segundo, nenhuma das propostas apresentadas pelos empreiteiros reuniram as condições financeiras e ou documentais para serem aprovadas. Mais, tentou ainda a AHBVSCT recorrer ao mecanismo (legalmente possível, por se terem gorado os dois concursos públicos) de “ajuste directo”, com o convite a três empresas que admitiram interesse na execução da obra. Mas também nenhuma das propostas apresentadas por estas puderam, nas condições regulamentares, ser aprovadas.

Entretanto, neste processo e nos desenvolvimentos subsequentes de elaboração e, sobretudo de alteração dos projectos (projecto de arquitectura e, mormente, “projectos de especialidade”), a AHBVSCT foi obrigada a gastar cerca de 50.000,00 euros.

Tendo em conta que todo o processo de “saldo” do QREN tinha que estar finalizado até 31/12/2015 e face a que já não haveria tempo para executar a obra com base em (eventual) novo concurso público, a AHBVSCT acordou com o MAI / QREN /POVT a rescisão do contrato de financiamento.

Entretanto, ainda em 2015, a AHBVSCT requereu à ANPC novamente a aprovação do  projecto (ainda que com novas alterações), visando assumir (nova) candidatura a financiamento, agora, pela primeira vez, no quadro “20-20” (POSEUR) que, entretanto foi aberta. Contudo, tal parecer da ANPC foi negativo, tal como o foram os requeridos por  praticamente todas as cerca de 40 associações nas mesmas condições.

Entretanto, na sequência da publicação da Portaria 143-A/2016, de 16 de Maio, foi conferido um maior rigor e realismo ao enquadramento da ANPC para este tipo de obras, sobretudo pela constituição de uma comissão técnica que, deslocando-se a todas as associações, analisou e decidiu a emissão dos pareceres da ANPC mais objectiva e sustentadamente – – esperava-se –, não só do ponto de vista técnico como financeiro (estimativa do valor a atribuir à obra para o pedido de financiamento).

Neste contexto, ainda que com nova alteração dos projectos (imposta pelo condicionalismo estabelecido na referida portaria), foi aprovado o parecer respeitante à AHBVSCT, o que permitiu a apresentação de candidatura de financiamento ao POSEUR, a qual foi aprovada em Dezembro de 2016.

Isso permitiu o lançamento de (novo) concurso público, mantendo o referido critério do preço – base: a estimativa de valor da obra definida pela ANPC e que, neste caso, foi o de 351.486,00 euros (acrescido do IVA – taxa legal de 6%). Se bem que deste valor o POSEUR não considerasse elegível para financiamento (85%) as despesas com consultoria (3.075,00 euros), bem como, inclusive, custos com trabalhos que a ANPC considerou exigíveis (portanto, exigíveis pela ANPC mas não elegíveis para o POSEUR …) para dar parecer favorável ao projecto (caso das instalações de higienização das ambulâncias, no valor de 10.600,00 euros).

Lançado esse concurso, surgiram apenas três propostas, todas elas sem condições (valores apresentados totalmente irrealistas) para serem aprovadas.

Daí, foi percebido claramente pela Direccção da AHBVSCT (pelas avaliações técnico-financeiras que procurou reunir) que o mercado considerava aquele preço-base do concurso manifestamente exíguo (o que significa que a ANPC subvalorizou a estimativa do valor da obra, com base no qual a AHBVSCT definiu o preço-base do concurso público). Concretamente, o preço estimado pelo mercado para a obra variaria entre 460.000,00 e 475.000,00 euros.

Só foi possível o lançamento de novo concurso público (já em Agosto de 2017) com a assunção por parte da Câmara Municipal, em Julho de 2017, de um apoio suplementar de 70.000,00 euros, acrescendo ao do pagamento da comparticipação própria (15% – cerca de 60.000,00 euros), isenção de taxas no processo de licenciamento e disponibilização de apoio técnico (fiscalização e coordenação de segurança) que, em reunião de Câmara de Janeiro de 2017, já tinha decidido.

Neste segundo concurso (em que o preço-base estabelecido foi de 460.000,00 euros), foram aceites cinco propostas em condições regulamentares, tendo apresentado  o preço mais baixo (critério único do concurso público), 443.412,10 € (acrescido de IVA – 26.604,73€), a empresa construtora com a qual foi agora assinado o auto de consignação, depois do contrato de empreitada (prevendo um prazo de execução de nove meses, em Janeiro de 2018.

Neste (longo) processo, importa destacar alguns aspectos:

– O facto de se deverem entender estas obras não exactamente como ampliação e remodelação do “quartel” mas, mais exactamente, como ampliação e remodelação do edifício do quartel . Isto, no sentido de que, verdadeiramente, só se pode entender a estrutura como quartel se o edifício for específica e devidamente equipado como tal, sendo certo que, do equipamento existente (instalações sanitárias, mobiliário, etc,), praticamente nada é reaproveitável.

– O apoio da Câmara Municipal de S. Pedro do Sul, absolutamente decisivo, compreendendo o interesse da obra para a melhoria da estrutura de Protecção Civil de que é especialmente responsável no concelho e o erro de gestão que seria o desperdiçar-se um apoio financeiro comunitário;

– O apoio de um vizinho do quartel (professor Doutor João Ferreira de Almeida), com a doação de uma porção de terreno contígua com 210 metros quadrados quadrados, permitindo o alargamento do parque auto;

– O apoio dos proprietários de terrenos e edifícios que permitiram, gratuitamente, a instalação provisória das viaturas e bombeiros durante a execução das obras, mantendo a operacionalidade do Corpo de Bombeiros;

– O apoio da comunidade, das pessoas individualmente consideradas, na generosidade demonstrada nos peditórios já promovidos (apesar de tentar evitá-los) pela AHBVSCT;

– O esforço da AHBVSCT, num quadro de muitas outras dificuldades. Quer o financeiro (de que se destacam os cerca de 50.000,00 euros em consultoria e alterações de projectos só exiguamente comparticipados), quer o administrativo (dos órgãos sociais e comando do CB), quer o social, das bombeiras e bombeiros (em actividades de tentativa de captação de fundos).

Não obstante reconhecendo a extensão deste texto, julgou-se dever aproveitar a disponibilidade editorial da GAZETA DA BEIRA para, sobre este prolongado e desgastante processo, dar à comunidade, instituições e entidades mais directamente envolvidas a informação tão objectiva e precisa quanto possível que se lhes considera devida.

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