Francisco Queirós
Celebrar Abril sem esquecer o drama dos “Retornados”!
Celebrar Abril sem esquecer o drama dos “Retornados”!

Tenho família que deixou uma vida de trabalho e sacrifícios na antigas Colónias. São alguns dos mais de 500.000 portugueses espoliados do ultramar. O meu saudoso tio Vieira bem foi avisado “tira daqui o teu dinheiro, vende a casa, isto vai rebentar”. Não nasci aqui, mas qui me fiz homem, os meus filhos são Angolanos, os meus ossos cá apodrecerão – só morto saio desta terra”. Não imaginava o que estava para vir…
No ano de 1975 ocorreu uma das maiores e mais rápidas transumâncias humanas de que há memória: mais de meio milhão de pessoas deixaram casas e haveres e voltaram a uma terra de que boa parte delas não partira.
Para trás ficou a sua alindada casa e o pecúlio amealhado em dezenas de anos de trabalho árduo! Do seu sofrimento ninguém quis falar nesta vela “metrópole”!
Sobre a descolonização portuguesa dizia Marcelo Caetano: “não é tão fácil (descolonizar) territórios onde se formaram grandes sociedades, economicamente desenvolvidas… não é possível, de um dia para o outro, levantar as tendas e partir, abandonando tudo a que se conquistou”; Já Mário Soares em entrevista ao “Der Spiegel (1974): “P- O que será dos brancos que não querem ficar em África? Em Moçambique já se iniciou entre os brancos um grande movimento de fuga. R – É verdade. Mas estou certo de que 2 anos após a independência e quando as instituições do País funcionarem razoavelmente, haverá mais portugueses em Moçambique que hoje…”; Soares ou era um mentiroso compulsivo ou vivia num planeta distante!
Não é a questão política de que quero falar! É o aspecto humano da descolonização! A ponte aérea, os aviões da TAP sobrelotados a levantar na quase total escuridão… Os caixotes nos cais aos milhares. As casas abandonadas, as famílias dispersas. O medo (muito)!
Ao chegar à metrópole, angolanos, moçambicanos e os outros foram rotulados de “retornados”… mesmo os que nunca tinham posto pé em solo europeu. Foi criado o IARN para os ajudar a sobreviver. Ficaram instalados em campos de férias, quintas abandonadas… traziam no bolso 5 contos dados pelo Governo e um coração pleno de saudades e revolta. Alívio também. Ao chegar, foram recebidos como intrusos: eles eram os que tinham vivido a explorar os africanos, pois agora que penassem, e não viessem roubar os empregos aos de cá. Acabaram por se integrar, mas o estigma ficou: muitos ainda são chamados, pejorativamente, de “Melros Brancos”…
Nos últimos anos, finalmente, começaram a ser publicados livros sobre a descolonização e o seu mais humano e pungente resultado: “os retornados”. Irá Portugal finalmente acertar mais esta conta – e pesada que é – com o seu passado e os fantasmas que o povoam?
Neste 2021 passam 46 anos sobre a vinda para Portugal daqueles que não lhe pertenciam. Espero que este seja o ano em que lembramos o Ano de Todos os Retornados.

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