Entrevista (Ed. 662)

Para “LER DEVAGAR” a entrevista que segue a José Pinho

José Duarte de Almeida Pinho, nasceu na década de cinquenta em Sul, freguesia que foi concelho para ser integrada em 1836 no concelho de S. Pedro do Sul, que mais cedo ou mais tarde será, por sua vez, integrado no futuro concelho de Lafões, a restaurar. Salvo se a Troika europeia e a de Lisboa, esta formada por “Bolonha” ou pelas Universidades dos trezentos, não empurrarem a “Sintra da Beira” para Viseu ou Castro Daire na projectada extinção de concelhos.

Gazeta da Beira foi encontrá-lo na “Ler Devagar” situada na “Lx Factory”, Rua Rodrigo de Faria, nº. 103 em Alcântara, livraria que agrega biblioteca, café, galeria e um amplo auditório. Não é fácil “dar com ele” face ao seu constante ir e vir, quase sem estar, entre Óbidos e Lisboa.

Gazeta da Beira – Qual a razão porque enveredou pela carreira de livreiro? Melhor dizendo de livreiro “especial”. Não estamos a citar Mourinho …

José Duarte de Almeida Pinho – Fiquei livreiro acidentalmente.

Há 16 anos, era eu Director Executivo de uma multinacional – à época muito tecnológica -, quando pensei mudar de vida. Preparei-me para trocar aquela multiplicidade de funções frenéticas por uma carreira que me parecia bem mais sossegada, aliciante e pioneira: queria ser um “pastor moderno”

Comprei uma casa de xisto meio arruinada no Bodial para nela poder instalar o comando das operações de pastorícia: seria uma central computorizada onde receberia as informações emitidas por um chip colocado em cada cabeça de gado que daria conta dos movimentos e da localização do rebanho a cada momento.

De seguida, propus-me comprar um lote de ruínas e uns terrenos de pedra, tojo e urze nas encostas do S. Macário e no outrora belíssimo vale do Massagoso, pertença de um familiar meu residente na África do Sul.

Um acidente indesejável fez abortar o negócio da compra do que seriam os currais e dos terrenos para recolher e apacentar o rebanho das cabras. Foi assim, por acidente, que se interrompeu, dessa forma breve e inesperada, uma carreira promissora na agro-indústria e na pecuária.

O projecto de pastorícia previa ainda a aquisição de casas e de outros edifícios abandonados do Massagoso onde seriam instaladas pequenas bibliotecas temáticas, partes de um centro cultural para usufruto de pastores e visitantes

Mas foi um outro acaso que fez de mim um livreiro.

Enquanto frequentava o 1º curso de especialização de Técnicos Editoriais numa tentativa de aperfeiçoar os meus conhecimentos de editor de uma revista só: a Devagar, dirigida pelo ilustre António Ferreira, cruzei-me, na Faculdade de Letras de Lisboa, com uma imensidão de editores queixosos da dimensão do stock de livros devolvidos pelas livrarias e dos livros que nem sequer tinham saído dos seus armazéns.

Como já então havia viajado um pouco por esse mundo, e porque conheci livrarias em muitas cidades europeias e americanas onde os fundos editoriais eram vendidos em grande quantidade e a preços de saldo, propus-lhes que, em conjunto, criássemos a primeira livraria de fundos de Portugal. A aceitação foi imediata, unânime e entusiasmada e, pouco depois, iniciámos a pesquisas de espaços onde pudéssemos abrir essa livraria.

Inesperadamente, encontrei-o num parque de estacionamento recém-instalado na antiga Litografia de Portugal, no Bairro alto, em Lisboa. Propus ao proprietário a cedência de 12 lugares de estacionamento, negociámos valores e acordámos as condições do aluguer.

Arrastei uma dúzia de amigos, convenci-os a investir comigo uma pequena parcela das suas economias, fizemos a obra, embelezámos o interior e abrimos a porta. Estávamos em 1999 e, sem sabermos se haveria um primeiro cliente, nasceu a Ler Devagar naquela Rua de S. Boaventura, à Rua da Rosa, em pleno centro do centro da cidade de Lisboa.

Foi esta livraria e as repercussões e referências internacionais produzidas por aquela Ler Devagar que fizeram de nós livreiros especiais.

G.B. – Como explica que havendo cada vez menos editoras e menos livrarias em Portugal, a Ler Devagar cresça de modo a ter inaugurado recentemente sete livrarias em Óbidos, cidade que o entrevistador conhece e da qual guarda excelentes recordações por razões profissionais. Sabe-se que em Portugal existiam em 2004, 694 livrarias e em 2012 existiam 562…

J.P. – A Ler Devagar cresce porque a Ler Devagar não é uma livraria como as outras. E cresce porque, apesar de tudo, move-se e continua a ter mais visitantes, mais utilizadores, mais clientes. E vende mais porque tem mais livros do que as outras livrarias. E tem livros que não se encontram nas outras livrarias. E tem bons livros.

A Ler Devagar é uma livraria mas também é uma biblioteca, um lugar de estudo, uma galeria, um auditório, uma discoteca. Na Ler Devagar pode-se conversar, ouvir música, ler, ver, beber, comer, fazer nada. E também comprar.

G.B. – O facto de ter nascido em Lafões, melhor dizendo, em Sul – São Pedro do Sul – não lhe faz sentir que tem obrigações também para com as gentes da sua terra?

Pensou alguma vez abrir uma livraria de referência em S. Pedro do Sul, que, como sabe, é a capital do Termalismo Português e Ibérico?

Por exemplo, constituindo uma parceria, designadamente com a empresa municipal Termalistur, Câmara, privados, como aconteceu em Óbidos. E podendo ir até Manhouce, aldeia nacionalmente conhecida pelos seus cantares tradicionais e cultura, onde encontrará base, instalações para manifestações livreiro-culturais.

 

J.P. – Eu sinto que tenho obrigações para comigo e para com os meus amigos: os familiares, os conterrâneos e os outros. E para mim, a minha terra é, e continuará a ser, o lugar onde eu me sentir bem. Em Lafões também me sinto bem. Por isso, a Vila Literária de Óbidos podia ter sido em Vouzela, nas Termas, em S. Pedro, em Manhouce ou no Fujaco se a infra-estrutura necessária (os edifícios) estivesse disponível.

G.B. – Vê algum inconveniente em que se considere a Ler Devagar, isto é, a sede na LX Factory, em Lisboa, uma espécie de delegação cultural dos artistas, escritores, poetas da região, inclusive um sitio onde se discuta Lafões, o seu futuro, e não só?

J.P. – Não só não vejo qualquer inconveniente como acho que é uma obrigação, uma daquelas obrigações que referia há pouco. Nós temos o espaço, os meios e as condições para podermos acolher os que nos procurarem. Se forem de Lafões, que é a região de onde provem uma parte significativa dos fundadores da Ler Devagar, tanto melhor. Esperamos que venham mais solicitações.

E repare que no próximo dia 24 de Outubro se fará aqui o lançamento em Lisboa do interessante e original livro do Dr. Guimarães da Rocha, denominado “O Regresso Imaginário” e isso é já uma manifestação cultural.

Às 7 da tarde desse dia, sexta-feira, a cerimónia do lançamento começará com uma sessão de fados de Coimbra pelo “Grupo Jurídico do Canto e da Guitarra de Coimbra” que integra dois ilustres lafonenses e para a qual estão convidados todos os naturais da região, onde quer que residam.

Terminada a entrevista o entrevistador deixou-se ficar pela livraria. A observar o seu movimento e a atmosfera especial que ali se respira. Com os livros expostos de maneira singular que permite o embelezamento e procura fácil.

Clientela numerosa. Muitos estrangeiros, maioritariamente jovens. Todos, nacionais e estrangeiros vestidos de modo a darem um ar cuidadosamente descuidado.

As gentes da cultura gostam, às vezes, de mostrar um “ar cultural”.

Ao levantarmo-nos para virmos embora deparamos com uma revista chinesa, escrita em chinês e em inglês. A “360º. Design”. Trás um artigo com as livrarias que considera as mais bonitas da europa. A par de inglesas, francesas, italianas, reproduz fotos da “Ler Devagar”.

José Pinho

José Pinho é um cidadão do mundo como gosta de dizer. Hoje, um activo agente da cultura portuguesa e seu dinamizador.

Vejamos para melhor o identificarmos aspectos do seu “curriculum”.

Antecedentes:

* Técnico Auxiliar do INE-Instituto Nacional de Estatística

* Vendedor de Jornais: Journal du Dimanche e Libération (Paris)

* Ajudante de Cozinha, Barman e Chefe de Cozinha (Discophage)

* Técnico Fabril na Construção Naval (Argibay)

* Membro da Comissão de Trabalhadores da Argibay e da Comissão Coordenadora das Comissões de Trabalhadores da Indústria Naval (Portugal)

* Professor Ensino Secundário (Liceu Camões),

* Promotor (MultiConselho) e Inquiridor (Saúde e Educação)

* Sócio e Director de empresas (Finalgráfica, LeadGest, Cato Johnson, Wunderman e FutureCom);

* Fundador da Ler Devagar (Bairro Alto);

* Co-fundador da Nouvelle Librairie Française, da Livraria Ler Devagar Artes, da Culturgest, da Livraria Ler Devagar Cinema, da Cinemateca Portuguesa, da Livraria da ZDB, da Fábrica de Braço de Prata e da Livraria da Pensão Amor;

* Consultor Holos/Google Empresas

* Finalista dos cursos de Línguas e Literaturas Modernas e de Técnicos Editoriais na Faculdade de Letras (Lisboa) e frequência do Curso de Gestão de Riscos/Risk Net (Chicago/ Nova Iorque);

* Director em Associações Profissionais (APEL), Culturais (Ler Devagar-Associação Cultural) e Escolares (Adeco- IPSS);

Actualmente:

* Administrador da Livraria de Fundos SA (LX Factory e Pensão Amor),

* Sócio Gerente da Ler Devagar, Lda (Óbidos)

* Sócio da Nouvelle Librairie Française (Lisboa).

* Promotor e Gestor da Vila Literária e do Festival Internacional Literário de Óbidos,

* Director da Sociedade Vila Literária – Associação Cultural (Óbidos) e da ADECO – Jardim de Infância das Mercês (Lisboa).