Entrevista a Eugénio Lopes da Silva Lobo

Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Vouzela

■ O livro que se encontra em cima da mesa foi escrito muito recentemente por o Sr. Eugénio Lobo para homenagear a Banda da Sociedade Musical Vouzelense

 

“Gente Que Ousa Fazer”

• Paula Jorge

Olá! Estarei convosco para responder a mais um desafio. Espero não vos desiludir.

A rubrica “Gente Que Ousa Fazer “será assente numa entrevista a alguém que tenha algo válido no seu percurso de vida. Gente que sabe o que quer e, acima de tudo, que luta por aquilo que quer. As entrevistas serão sempre encaminhadas de forma a mostrar o lado melhor que há em cada um de nós e, dentro do possível, ousar surpreender o leitor. Serão entrevistas com a marca das nossas gentes, da região Viseu Dão Lafões, de todos os quadrantes e faixas etárias. Vamos a isso!

 

Ficha Biográfica

Nome: Eugénio Lopes da Silva Lobo

Idade: 90 anos

Profissão: Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Vouzela há 40 anos (desde 1980)

Livro preferido:  Não tem

Destino de sonho: Felizmente não me revejo nesses destinos de sonho!

Personalidade que admira: Todas as pessoas honestas!

 

Muito obrigada, Senhor Eugénio Lobo, por mostrar disponibilidade para esta entrevista da rubrica “Gente Que Ousa Fazer”. Comecemos pelo princípio.

Paula Jorge (PJ) – Pode descrever-nos o seu percurso académico?

Eugénio Lobo – No fim da instrução primária, fui para Águeda para a Escola Comercial e Industrial e aí tirei os dois cursos ao mesmo tempo. O industrial, de dia até às 18h, e das 19h até às 23h tirei o curso comercial. Saí com estes dois diplomas aos 16 anos. Aos 17 anos fui estagiar para a Repartição de Finanças de Sever do Vouga com vista a concorrer para o lugar de Aspirante de Finanças.

 

PJ – Neste seguimento, o Senhor Eugénio Lobo pode contar-nos o seu trajeto profissional?

EL – Em 1952 fui colocado como Aspirante de Finanças em Alcanena, distrito de Santarém. Em 1955 fui transferido para a Repartição de Finanças de Vouzela e em 1962 fui promovido a 3º Oficial e colocado na Direção de Finanças de Viseu no Serviço criado: Imposto sobre consumo supérfluo ou de luxo (hoje é o IVA). Em 1965 passei à situação de licença ilimitada sem vencimento, tendo passado a exercer a profissão de Solicitador em Vouzela. Em 1968 regressei às Finanças de Vouzela, onde permaneci até à aposentação. Quando regressei tinha a categoria de 3º Oficial, tendo sido promovido ao lugar de Chefe da Repartição de Finanças de Vouzela, lugar que exerci até à minha aposentação.

 

PJ – Sei que é dos provedores com mais tempo no cargo. Ao serem escolhidos os órgãos sociais deve haver, segundo o que sei, muito cuidado. Pode falar-nos sobre essa situação?

EL – Sim, sou! e isso deu-me muita experiência. Só deve haver, devem ser escolhidos irmãos sociais, nomeadamente para a mesa administrativa, especialmente para o cargo de Provedor uma pessoa com disponibilidade de tempo que saiba arranjar soluções para as dificuldades que possam surgir. Deve ser uma pessoa honesta que exerça o cargo gratuitamente, numa atitude de serviço à comunidade, não basta só os seus méritos sociais.

 

PJ – Muitas histórias terá guardadas durante todo o seu percurso profissional.

Quer partilhar connosco aquela que mais o marcou?

EL – Foram muitas, mas especialmente o convívio na mesa do canto, onde comia, juntamente com os meus colegas (Coelho e Gonçalves) e o saudoso Dr. António Simões.

 

PJ – Que lições tirou dessa marcante experiência?

EL – Continuar a viver com honestidade que tanto prezo. Ainda hoje, para mim, a palavra vale mais do que uma escritura.

 

PJ – Quer falar-nos da sua vinda para o cargo de Provedor que ocupou desde 1980 ao serviço da Santa Casa da Misericórdia de Vouzela?

EL – Em 1979, o meu grande amigo, Dr. António Simões, telefona-me a pedir-me para ir a casa dele, pois precisava de falar comigo. Longe de mim pensar qual o teor da conversa. Convidou-me para exercer o cargo de Provedor na Santa Casa da Misericórdia de Vouzela. Foi uma surpresa para mim. Recusei, mas o Dr. António Simões continuou a insistir. Dada a insistência, disse-lhe que iria falar com a esposa e depois diria alguma coisa, com o que ele concordou. Dias depois disse-lhe que, com muito custo e atendendo à amizade, aceitaria o cargo. Ao assumir o lugar de Provedor encontrei uma Misericórdia adormecida, sem dinheiro, com dívidas e sem rendimentos. O primeiro objetivo foi estabilizar economicamente a Santa Casa. A minha maneira de ser irreverente logo começou a pensar em dinamizar a instituição e isso fui conseguindo, graças ao grupo de trabalho que me acompanhava. O Hospital encontrava-se nacionalizado e sem pagamento de qualquer renda. Esta situação não poderia continuar e, juntamente com outros Provedores, conseguimos que o Estado nos pagasse as rendas, o que foi uma grande ajuda. Mais tarde, a Insistências Partidárias (CDS) que pretendiam que fosse candidato a Presidente da Câmara de Vouzela, depois da minha recusa, foi-me pedido pelo Secretário do Sr Ministro dos assuntos Sociais de então, para passar por Lisboa para falar com o Sr. Ministro. Sabia para o que era e como não queria ser candidato à Câmara, guardei segredo, mas o Mesário Luís Bordonhos, que trabalhava em Viseu e fora abordado pela Comissão Política, insistiu comigo para que fosse a Lisboa falar com o Ministro. Assim aconteceu. E com esta visita trouxe algum dinheiro, o que ajudou a desafogar o sufoco da situação económica da Santa Casa.

■ Futura Clínica de S. Frei Gil

 

PJ – Quer falar-nos de alguns projetos já realizados e outros mais recentes em que a Santa Casa da Misericórdia esteja envolvida?

EL – Projetos foram vários. Desde a construção do edifício onde se encontra a Caixa Geral de Depósitos, a construção de 18 apartamentos junto ao Jardim de Infância, além da recuperação de edifícios de Lisboa e muitos outros. Mais recentemente, espera-se que entre em funcionamento a nova clínica de S. Frei Gil. Esta obra dará lugar a uma clínica de grande qualidade. Tem uma área de ocupação de 200 metros quadrados, onde irá ser implementada, além de outros serviços, a clínica do coração. Clínica inovadora na região. Na parte superior deste edifício encontra-se uma residencial sénior de muita qualidade, o que também muito honrará, não só Vouzela, como toda a região.

 

PJ – No seguimento da questão anterior, sei que aumentou o património da Santa Casa…

EL – É verdade, foram vários os investimentos, como já referi e irei especificar melhor. Foi bastante aumentado, em Vouzela, a construção do Lar de Idosos, o Lar de S. Francisco para a comunidade religiosas, as profundas obras de restauro da Igreja da Misericórdia. Compra e restauro: A casa de família Souto e Melo, uma casa na Feira, a casa que foi de Manuel Figueiredo junto à GNR, continua na Rua Dr. Gil Ribeiro, com 15 habitações e o r/chão onde se encontra a C.G.D., o prédio onde se encontra instalada a Clínica de S. Frei Gil, comprou uma casa ao lado, na rua Ribeiro Cardoso, continua na Rua Dr. Guilherme Coutinho um prédio com 8 apartamentos e respetivas garagens junto ao Jardim Infantil, profundas obras de restauro do edifício do Hospital, onde estão investidos cerca de 3 milhões de euros, está a acabar o prédio onde passará a funcionar a Clínica de S. Frei Gil, com 1.º piso e r/chão e na parte superior uma residencial sénior de muita qualidade, como já lhe disse antes. Também no Porto e Vila Nova de Gaia, a Santa Casa aumentou o seu património. Comprou um  prédio com 6 apartamentos e uma loja na Rua Pedro Hispano, comprou um prédio com 3 apartamentos e uma loja na Rua Antero de Quental, comprou um prédio na Travessa da Figueiroa, com 1 estabelecimento no r/chão e uma habitação no primeiro andar, comprou um apartamentos na Rua da Boavista. Em Vila Nova de Gaia comprou 2 prédios geminados com 4 apartamentos cada na Rua D. Fernando, comprou um prédio com 5 habitações na Rua António Rodrigues da Rocha.

Depois de todo este investimento devo dizer que a Santa Casa, não deve nada a ninguém, tem as suas contas equilibradas.

PJ – Por falar em residencial sénior, acredita que a sociedade dá o devido valor aos nossos idosos?

EL – Nesta Santa Casa é dado o devido valor! As funcionárias são escolhidas e podemos dizer que são ótimas no trabalho que exercem. Dão carinho aos utentes de que eles tanto precisam. A alimentação, contrariamente ao que acontece em algumas instituições, é confecionada na nossa cozinha, com produtos de qualidade, pois disso não abdico. Os idosos e as crianças merecem tudo. Aqueles, porque já não têm forças, devido à idade e as crianças também.

 

PJ – Além de Provedor da Santa Casa da Misericórdia, que outras paixões nutre, que o completam enquanto pessoa?

EL – Fui Presidente da Banda da Sociedade Musical Vouzelense, à qual me dediquei de alma e coração. Acabei agora de fazer um livro sobre notícias da mesma. Com o mesmo espírito, dediquei-me aos bombeiros Voluntários de Vouzela, ocupando o lugar de Vogal da Direção. A primeira ambulância Peugeot 404 foi comprada com o esforço que eu e o meu grande amigo, Dr. António Simões, tivemos para arranjar dinheiro para a comprar.

 

PJ – Imagine a sua vida sem a Santa Casa da Misericórdia, como seria?

EL – Eu sei lá como seria! Uma vida de reformado, tranquila. Como a minha vida nos últimos 40 anos foi de dedicação, 24 horas por dia, à santa Casa da Misericórdia, sem qualquer salário, é difícil eu conseguir responder a essa questão.

 

PJ – Apenas numa palavra, pode descrever-se?

EL – Honesto!

 

PJ – Para fechar esta entrevista, o que me diz o seu coração?

EL – Que o meu percurso na Santa Casa foi de total dedicação e preocupa-me o futuro. O Provedor da Santa Casa tem de ser uma pessoa sem pretensões de vaidade, com disponibilidade de tempo, que saiba resolver as questões e não queira protagonismo e, acima de tudo, honesto.

 

PJ – Quero, em meu nome pessoal e em nome da Gazeta da Beira, dizer-lhe que foi uma enorme honra, Senhor Eugénio Lobo! Desejo-lhe a continuação de um excelente trabalho e MUITO OBRIGADA! Peço-lhe que deixe uma mensagem breve a todos os nossos leitores.

EL- A Gazeta da Beira é para mim um Jornal bem organizado e que não vê somente a parte económica com anúncios e não notícias.

Para os leitores do Jornal Gazeta da Beira aconselho que continuem atentos às notícias que este dá e a quem desejo tudo de bom. Muito sucesso!

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