Crónicas do Olheirão por Mário Pereira

Democracia implica igualdade

São cada vez mais e mais fortes os movimentos que aproveitando-se das regras da democracia para chegarem ao poder as ignoram e as violam para o manterem.

Há 50 anos a norma era os ditadores tomarem o poder através de golpes militares, mas isso deixou de ser necessário, porque os eleitores se encarregam de lhes entregar o poder votando neles.

Perto de nós, temos a Hungria e a Polónia onde ainda há a preocupação em manter uma democracia formal, mas também a Rússia e a Turquia que nem se dão a esse trabalho.

O último exemplo é Donald Trump, de facto um líder autoritário, que chegou ao poder usando os mecanismos da democracia, mas que, no momento em que os resultados não lhe serviram, rapidamente se esqueceu desses detalhes e tentou um golpe de estado para manter o poder.

A questão inquietante é, porque razão tantos de nós votam em líderes destes?

Sem necessidade de análises profundas é possível constatar que a democracia  não têm conseguido fazer com que todas as pessoas tenham e sintam que têm um poder efetivo ou sequer sintam que as suas preocupações são ouvidas por quem tem o poder.

A lógica é simples: “os políticos não dão importância aos nossos problemas e só nos usam para alcançarem e manterem o poder. Assim, é indiferente se quem manda cumpre ou não as regras, porque as regras só servem os poderosos”.

A questão tem de ter uma solução política, mas não é apenas política.

Ela está profundamente ligada ao crescimento das desigualdades, cada vez mais sentidas pelas pessoas comuns.

A desigualdade nos rendimentos tornou os ricos muito mais ricos e é clara a percepção de que o dinheiro acumulado por 1% das pessoas mais ricas dava para que os pobres e os remediados tivessem vidas melhores.

A par desta desigualdade persistem inúmeras situações de desigualdade no acesso aos direitos à educação, à saúde a uma habitação e, em muitas sociedades, ainda é gritante a desigualdade entre homens e mulheres.

Não será por acaso que nas primeiras formas de democracia o direito de voto era atribuído apenas a quem cumprisse determinadas condições, por exemplo: homens proprietários, homens que soubessem ler, os homens brancos, etc. O princípio era que os inferiores não votavam.

A democracia plena para funcionar precisa de que todos os participantes sintam que são iguais em direitos e em valor e que isso é respeitado por quem tem o poder.

Essa utopia nunca foi alcançada e uns continuam a ser mais iguais do que outros, gerando muitas frustrações.

Os populistas são hábeis em fazer sentir às pessoas que compreendem as suas frustrações e em criar a ideia de que elas se devem a um ou vários inimigos, sejam eles os ciganos, os comunistas, os socialistas, os migrantes ou quem recebe o RSI. De facto os líderes populistas nunca identificam os verdadeiros beneficiários das desigualdades como inimigos, pois são fortemente apoiados por eles.

Defender a democracia passa por um programa efetivo de redução das desigualdades e o primeiro passo é fazer com que os muito ricos paguem o mínimo de impostos, mas isso os populistas não prometem nem querem fazer.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *