Carlos Vieira e Castro

Um orçamento que não reforce o SNS não serve os portugueses, mas o governo ainda vai a tempo de corrigir

Vivemos tempos únicos e difíceis que exigem medidas firmes para reforçar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), tão depauperado pelos governos da direita e até do PS (conforme reconheceu o próprio António Arnault), defender o emprego, proteger os desempregados e os mais pobres.

Acontece que o governo apresentou um Orçamento com um conjunto de medidas para combater a crise em 2021 que fica muito longe das necessidades derivadas da pandemia e da subsequente crise económica e social. O governo não gastou um cêntimo dos 4,5 mil milhões de euros que o Orçamento Suplementar autorizou a acrescentar à despesa orçamental de 2020.

Portugal foi um dos países europeus com menos investimento público em 2020 no combate à pandemia, só ficando à frente da Grécia e de Chipre, em percentagem do PIB.

Há quase 900 mil utentes sem médico de família e houve uma quebra de mil médicos entre Janeiro e Setembro deste ano.  No entanto, a transferência para o SNS apenas se reforçará em 0,03% relativamente ao executado no orçamento deste ano.

Sobre as implicações do OE´2021 na legislação laboral, Manuel Carvalho da Silva, ex-Secretário-Geral da CGTP, afirmou, num encontro com sindicalistas promovido pelo BE, que sem alterações este Orçamento é “uma armadilha dos diabos” para o mundo do trabalho e que o governo não proibir a caducidade unilateral da contratação colectiva é “um crime político”. Também Sérgio Monte, Secretário-Geral Adjunto da UGT e membro da Comissão Política do PS, reconhece que nem o governo nem o PS querem alterar as leis laborais da direita, que criticaram no tempo da Troika. “Este é um quadro político com o apoio da direita”.

O próprio FMI recomenda, para fazer face à recessão que se prevê agravar para o ano, uma “grande expansão orçamental” (investimento público) e sustentação do consumo com reforço do poder de compra, para compensar ausência do investimento privado.

Lembro que nos Açores a extrema-direita não foi buscar votos ao Bloco de Esquerda, que até reforçou a sua votação, mas sim ao PS. A indefinição e o “faz que anda mas não anda” é que promove o desalento e abre caminho à extrema-direita populista, racista e apoiada por neonazis, em Portugal como no resto do mundo. E foi com esta gente que o PSD aceitou fazer acordos para governar os Açores. Ao arrepio da derrota de Trump.

Melhor fariam os militantes do PS que nos últimos dias se entretêm a zurzir no BE, se fizessem pressão sobre o governo para recomeçar negociações sérias com o Bloco.  Ana Sá Lopes no editorial do Público de 27.10.2020, com o título “António, chame o Pedro Nuno” lembrou:  “Costa contava com maioria absoluta em 2019 e começou a descartar a “geringonça”, que formou para chegar ao poder já no fim da última legislatura. Ao não aceitar novos acordos escritos, sonhou com aquilo que as urnas não lhe deram: um poder para fazer exactamente aquilo que quisesse, conforme os seus melhores interesses. À “humildade” de 2015 sucedeu a arrogância de 2020. A relação estragou-se.”

Quem estragou deveria ser o primeiro a compôr. Catarina Martins já disse que está pronta para continuar a negociar na especialidade.  Costa ainda vai a tempo, a menos que prefira arriscar uma espécie de “Queijo Limiano”.

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