António Gouveia

Competição, Competitividade, Produtividade

Muito se falou da crise e do resgate do país e, logo a seguir, da austeridade que quase nos ia derrotando. Não que ela não fosse necessária e útil para por ordem no esbanjamento, mas apenas por não se dever chamar austeridade, uma expressão menos agressiva, como contenção de gastos, ou um termo simples como sobriedade misturada com poupança inteligente, seria suficiente, muitos os anos a gastar à tripa forra o que não era nosso mas da banca estrangeira que, por sua vez, iludiu a banca doméstica e esta a todos nós com originais técnicas de marketing e produtos financeiros inovadores, geradores de boas taxas e dividendos – diziam então os yuppies no final da década de 80 -, os mesmos vendilhões que hoje, já crescidos, passarões descarados em outros poleiros, lhes chamam produtos tóxicos. Por isso o índice da dívida externa, ao tempo do marcelismo e finais do estado novo, em cerca de 15 % do PIB, está hoje nos 130 %, brutalidade irrecuperável e impagável.

O certo é que a economia se desfez, sobretudo a determinada pelo setor do imobiliário e da construção civil e afins, as demais empresas fornecedoras de materiais, máquinas, equipamentos e utensílios a jusante: cerâmicas e de artigos cerâmicos, fábricas de torneiras e outros artigos de pichelaria, de mobiliário, por aí fora. Estas empresas, tamanha a ambição transformada na ganância do lucro – sempre assim foi quando o negócio prolifera, nunca há tino na torre do sino -, começaram a entrar em insolvência e despedimentos e, em consequência, assistimos ao desfazer de equipas multidisciplinares de operários e artistas das várias especialidades, bem qualificados. Uns rumaram, em desespero, ao estrangeiro; outros, em pior desespero, caíram na fatalidade do desemprego. E foi este desmoronar de duas décadas e meia de trabalho de grandes equipas sem culpa própria que nos trouxe até aqui, foi-se a competição e a competitividade, termos diferentes, também a produtividade, a mesma família económica.

Competição, sabemos o que é, aprendemo-lo, por intuição e  priori, em miúdos, pontapés na bola, na escola primária: luta, esforço, combate, desafio, concorrência, disputa. Competitividade é diferente: é mais do que competição, acresce-lhe competência e saber de experiência feito para enfrentar a concorrência, espreitar ou espionar o que ela faz melhor e a melhor preço para a ultrapassar. Tal como a produtividade, produzir com eficiência e eficácia, isto é, mais e melhor, sem perder tempo no tempo certo. Todo este desmoronar de um castelo modelo cujas sólidas paredes estavam incrustadas com azulejos cerâmicos coloridos de excelentes artistas, interligados e especializados em múltiplas tarefas, demorará muito a reconstruir, esta mão-de-obra de qualidade foi sugada pelo estrageiro, já lá está a dar o seu melhor, a produzir riqueza e valor que aqui fazem falta para si e famílias e para ajudar a pagar a dívida e a diminuir os défices orçamentais recorrentes do país. O IEFP, a entidade pública que trata do emprego e da formação, por outro lado, distraiu-se do fenómeno, não avaliou o tsunami que abriu enorme brecha na economia nacional, algo poderia ter feito, recrutando os melhores das muitas empresas insolventes e em decadência para os ajudar a integrarem-se em pequenas empresas de serviços ou dar formação que tanta falta faz a tantos jovens sem emprego, sem competência técnica e muitos diplomas académicos. E assim estamos, sem bons quadros, experientes e qualificados. Mais grave ainda, esta tolice da redução da carga laboral para 35 horas/semana, ainda por cima exclusiva para a função pública quando sabemos que ela sobra na grande Lisboa e falha no resto do país, a paisagem, como eles dizem, os que gozam do maior poder de compra e da mais alta qualidade de vida, um país muito heterogéneo. O problema – lembre-se, leitor, a palavra vem do grego – probéma-atos, passar para diante -, é que a economia é uma ciência ligada à matemática, aos números e valores, subjetivos e morais, mas não só, também objetivos e de futuro, moeda representada em euros ou divisas estrangeiras. Como se resolve esta equação difícil e muito complicada, passando-a para diante? Com leis laborais mais liberais à mistura com uma boa e apertada regulação do trabalho e do capital, ex aequo, justiça e equidade com conta, peso e medidas drásticas em cima tanto do empregado mandrião como do patrão ladrão (falo de valores do trabalho, não de pessoas, estas, como as coisas, são o que são, há de tudo como na botica). E, já agora, uma melhor repartição entre o capital e este, afinal é o trabalho que dá o maior valor acrescentado e a maior mais valia à produção da riqueza, esta percentagem tem de olhar também para o futuro, para diante, cá está, um outro problema, deve sobrar ainda para pensões, a fonte pode secar um ano destes prestes a chegar.Redação Gazeta da Beira

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