António Bica

A necessidade de alargar ao interior norte e centro do país as medidas de ajuda ao rendimento agrícola pela PAC (Política Agrícola Comum) (4)

Foto Paulo Paiva

 

A subsidiação e a restrição da produção agrícola não é o que melhor serve os interesses dos agricultores mediterrânicos

Entretanto os países em vias de desenvolvimento contestaram a subsidiação das exportações agrícolas dos países que integravam a CEE para as tornar competitivas no mercado internacional, o que foi feito no âmbito do GATT (General Agreement on Trade and Tariffs), organismo internacional de comércio a que sucedeu a OMC (Organização Mundial do Comércio).

Assim, para, sem reduzir os preços, limitar a produção de excedentes, a reforma da PAC optou por restringir as principais produções agrícolas, fixando quotas, e deixou de garantir a sua retirada do mercado.

A reforma da PAC que se seguiu passou a atribuir subsídios às produções agrícolas para que os rendimentos dos agricultores não baixassem.

Os países em desenvolvimento contestaram na OMC o direito de a CEE subsidiar as produções agrícolas, o que levou a nova reforma da PAC com abandono da subsidiação em função das quantidades produzidas, mas atribuição de subsídio fixo por hectare sem exigir que a terra seja cultivada, o que foi feito em função das médias de produção dos últimos anos, sendo, no essencial, estes os subsídios actualmente em vigor, com a designação de R.P.U. (regime de pagamento único).

Entra em vigor em 2015 nova reforma da PAC. Os países em desenvolvimento, conhecidos por países emergentes, que têm cada vez maior peso económico e político, (Brasil, China, Argentina, Índia e outros) opõem-se, no âmbito da O.M.C., a que a União Europeia mantenha a subsidiação agrícola sob a forma de RPU (regime do pagamento único) e resista à extensão aos bens agrícolas do regime de comércio internacional em vigor no âmbito da OMC para os bens industriais e os serviços.

A discussão desse assunto foi aberta há vários anos em Doha, cidade dos Emiratos Árabes, e continua aberta.

Os países emergentes acabarão por impor a sua pretensão. Na perspectiva dessa inevitabilidade resulta que, com a próxima reforma da PAC, acabará o R.P.U. (subsídio em regime de pagamento único) devendo estabelecer-se medidas que garantam que a actividade agrícola conserve o meio ambiente, os recursos naturais, a biodiversidade, a diversificação de produções, fomente a inovação, a ocupação humana (emprego), apoie o investimento em meio rural.

Pretendendo-se isso da próxima reforma da PAC, ela poderá ser compatível com o fim dos subsídios e com a extensão aos bens agrícolas das regras de comércio internacional aplicáveis aos bens industriais e de serviços, não procedendo o argumento, frequentemente usado, da necessidade de obstar ao chamado «dumping» social, isto é do emprego, pelos países emergentes, de trabalhadores a que não são garantidos suficientes direitos sociais, que, se isso não é fundamento para restringir o comércio de bens industriais e de serviços, não se justifica que o seja para os bens agrícolas.

 

A questão da chamada soberania alimentar

Há todavia que preservar a chamada soberania alimentar, a capacidade de cada país garantir à sua população o abastecimento, em quantidade suficiente, de alimentos básicos no caso de perturbação do comércio internacional que o impeça ou dificulte.

Para isso se poder garantir é preciso que as terras com capacidade produtiva se mantenham em condições de entrar imediatamente em produção, os agricultores que as gerem tenham conhecimentos técnicos suficientes e actualizados para produzir e disponham da necessária maquinaria agrícola.

Se, além disso, cada país mantiver reserva alimentar básica permanente suficiente para alimentar a sua população durante um ano, nesse prazo é possível iniciar e concluir a produção de alimentos básicos (grãos, outros vegetais e carne de frango), para a assegurar no futuro.

A próxima reforma da PAC, se previr o pagamento aos agricultores dos bens sociais a produzir por eles que se considerar que, em cada território, de acordo com as características de solo e clima, devem ser produzidos (conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da biodiversidade, a ocupação humana e adequado emprego, que é o que se pode designar por humanização do território) garantindo-lhes condições de vida suficientemente niveladas com as da população urbana, não precisa, nem deve, atribuir-se-lhes subsídios, porque os agricultores, se produzem bens (ambientais e outros) de interesse social, devem ser remunerados por isso com justiça e não subsidiados como se fossem grupo social a viver de esmolas, ou de proprietários de terra, que, só por o serem, devam receber renda fundiária paga pelo poder público.

Essa remuneração a pagar aos agricultores pelos bens sociais que produzirem terá que ser necessariamente variável de região para região de acordo com as características de solo e de clima e dos objectivos pretendidos e contratados pelo poder público quanto a conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da paisagem, da biodiversidade e de ocupação humana, e o seu pagamento ser feito sem burocracias complexas, em tempo, ficando apenas dependente da área gerida, grande ou pequena, e da obrigatória, prévia, efectiva, isenta e atempada verificação do cumprimento dos objectivos contratados, com redução proporcional ao grau de eventual não cumprimento.

A formação e actualização profissional dos agricultores e o seu equipamento com máquinas agrícolas terá que ser objecto de adequados mecanismos de garantia e de compensação, tendo também em conta as características de cada região quanto a clima, solo e potencial uso.

Este tipo proposto de reforma da PAC garantirá que todos os agricultores, independentemente da dimensão do terreno que gerirem e sem imposição das condições que actualmente tendem a excluí-los, como são as áreas mínimas, a exigência de contabilidade organizada e semelhantes, recebam o pagamento dos serviços que com a sua actividade prestarem à comunidade.

Com isso pôr-se-á fim à actual injustiça de os subsídios agrícolas pagos pela PAC serem recebidos quase exclusivamente pelos grandes agricultores independentemente de cultivarem ou não a terra.

Estes propostos objectivos para a próxima reforma da PAC poderão garantir boa preservação do ambiente, da paisagem, da biodiversidade, das águas superficiais e subterrâneas, a ocupação e humanização do território rural, a capacidade de atrair população urbana que cada vez mais aí procura tranquilidade ou o regresso às raízes rurais familiares, antigas ou recentes, e não impedirão que cada agricultor, para além de assegurar a produção dos bens ambientais e culturais de interesse social por que for pago, produza o que entender nas terras por ele geridas, sem que por isso deva receber subsídio, garantia, ou outra compensação senão o preço que obtiver no mercado.

Essas produções tenderão a ser as economicamente mais viáveis no solo e no clima da exploração agrícola e mais facilmente colocáveis no mercado, incluindo no de proximidade (aldeia e centros urbanos próximos).

Portugal tem condições favoráveis para competir na produção de vinhos, fruta, hortícolas de estufa, azeite, madeiras para pasta de papel e cortiça e, na média distância (Portugal e Espanha), com leite e carne, passando a ser de maior interesse as produções segundo técnicas de preservação ambiental.

A PAC não poderá deixar de apoiar investimentos no meio rural para melhorar as condições de vida nele e potenciar a capacidade de atracção de gente urbana para aí se fixar e de visitantes.

Continua em próxima edição da Gazeta

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