A instalação da Carbon Team em Campia pode ser o primeiro passo de um “cluster” da mobilidade suave em Vouzela

Rui Ladeira, presidente do Município de Vouzela, em entrevista exclusiva à GB

 

Gazeta da Beira (GB) – Foi notícia com dimensão nacional a instalação da Carbon Team, uma unidade fabril para produção de quadros em carbono para bicicletas, no Parque Industrial de Campia, a primeira em toda a Europa. O que levou estes empresários a optarem por Vouzela?

Rui Ladeira (RL) – Vouzela procura posicionar-se não só na vertente industrial, mas sobretudo na inovação e na criação de oportunidades seja para quem já cá está, para os munícipes, seja para a Região e para o País. A Carbon Team é uma empresa de capitais estrangeiros, mas também de empresários portugueses da região de Aveiro, com tradição na área da indústria das bicicletas, com um trabalho reconhecido e que têm contribuído muito para o PIB nacional. Viram em Vouzela, no Parque Industrial de Campia, condições para instalar uma nova unidade diferenciadora no contexto mundial, porque só na Ásia é que hoje são produzidos quadros de bicicleta em carbono, na Europa não há. Termos esta oportunidade em Vouzela de estarmos na indústria 4.0 ou naquilo que se faz de melhor também numa vertente de valorização da natureza e de utilização da bicicleta é um grande motivo de orgulho. Mas este orgulho dá trabalho porque foi preciso um discurso motivador e credível e uma ação rápida e concretizadora junto dos empresários para captar e fixar este investimento em Lafões.

 

GB – Certamente que aqueles industriais terão ponderado outras possibilidades. Quais foram os principais fatores que conseguiram desequilibra a favor de Vouzela a escolha pelo Parque Industrial de Campia?

RL – Foi muito importante termos conseguido expor a estratégia do Município para o desenvolvimento deste território. Isso dá garantias de futuro às empresas. Por outro lado, a localização dos parques indústrias de Vouzela no eixo da A25 foi fundamental como vantagem comparativa para a captação deste investimento. Vouzela tem quatro nós na A25, importantes para o acesso das matérias-primas, mas igualmente para o posterior escoamento do produto. Depois, foram as oportunidades e condições fornecidas pelo Parque Industrial.  Não só o preço do metro quadrado do solo, mas a proximidade da Autarquia com os empresários, tanto no licenciamento como no projeto de candidatura a fundos europeus, bem como na colaboração com o GIP – Gabinete de Inserção Profissional, para tratar das necessidades da empresa quanto a quadros técnicos com formação superior.

GB – As questões ambientais tiveram algum peso na decisão?

RL – Vouzela é um concelho com uma marca de preservação ambiental assinalável e isso simbolicamente foi importante. O nosso posicionamento de valorização ambiental é claro, desde logo da bicicleta como forma de mobilidade sem poluição, sem emissões de CO2. Ora, um território que integra uma rede de ecopistas, como o nosso, que queremos seja o mais vasta possível, adequa-se muito à ideia da construção de uma bicicleta com quadro em carbono que diminui substancialmente o seu peso e, consequentemente, potencia a sua utilização.

 

GB – Sabemos que as bicicletas com quadro em carbono são as mais valorizadas no mercado. A produção da Carbon Team vai dirigir-se sobretudo à exportação?

RL – Nesta fase, a produção inicial vai ser essencialmente para exportação, mas vai também chegar ao mercado nacional. Esperamos que o mercado das bicicletas mais leves, com quadro em carbono, se desenvolva por cá também. De qualquer modo, Portugal é já o maior exportador de bicicletas.

GB – A Região tem disponibilidade de mão-de-obra para suprir as necessidades da Carbon Team?

RL – Há mão-de-obra disponível, gente qualificada ao mais alto nível no concelho de Vouzela e na Região, que se capacitou, por exemplo, na Universidade de Aveiro, nas engenharias mecânica, química, entre outras. Sabemos que há jovens que estão a trabalhar noutros pontos do País e no estrangeiro e já manifestaram disponibilidade de regressar para se candidatarem a uma atividade profissional nesta nova unidade industrial. É uma grande oportunidade para estes jovens voltarem à sua terra onde têm raízes, valorizando também a nossa comunidade.

 

GB – Quais são as expetativas quanto à criação de postos de trabalho?

RL – A curto prazo a unidade está numa fase de testes do produto, qualidade estrutural e design, prevendo-se sejam admitidos cerca de duas dezenas de técnicos até ao final do ano. Depois de afinada a plataforma e preenchida a carteira de encomendas vai começar a produção em escala, de modo a atingir a velocidade de cruzeiro em 2024 com 120 profissionais qualificados a operarem na Carbon Team, em Campia.

 

GB – Este projeto resume-se à instalação da Carbon Team?

RL – Vamos procurar que se crie uma dinâmica que leve à criação de um “cluster” ligado à indústria das bicicletas, de elevado perfil tecnológico. Vouzela está preparada e prepara-se para mais. Uma unidade industrial deste calibre vir para Vouzela demonstra que o concelho tem atrativos capazes de acolher novas unidades com este nível de referência. Os nossos parques industriais têm condições muito competitivas no quadro nacional e também somos atrativos pelas vantagens, nomeadamente fiscais, que conseguimos disponibilizar, como a isenção da Derrama durante 3 anos, mas também a rapidez com que conseguimos proceder aos licenciamentos. A Carbon Team levará certamente ao desenvolvimento de outras atividades conexas com a produção dos quadros em carbono que tenderão a instalar-se o mais próximo possível. Trata-se do embrião de uma estratégia de aglomeração ligada ao “know how” que vai ser desenvolvido em torno da indústria da mobilidade suave que, no futuro próximo, irá para além das bicicletas.

 

GB – Perspetiva-se um modelo de desenvolvimento inovador, baseado nas tecnologias amigas do ambiente?

RL – É a política que o município está a seguir, também a nível nacional, diga-se, para a utilização de meios de transporte suaves, como a bicicleta. A implementação de uma rede de ecopistas contribui para um ecossistema favorável à instalação deste tipo de indústria que exige um contexto favorável, não só em termos simbólicos, mas também em termos ambientais e de mão-de-obra qualificada. A expansão desta indústria da mobilidade suave a partir de Águeda para estes territórios do Caramulo contribuirá para um novo modelo de desenvolvimento modernizador que convive bem com as tradições rurais. Também estamos a conseguir captar criação de emprego na metalomecânica, com empresas de referência nacional, assim como nas madeiras. A nossa estratégia é a captação de investimento diferenciador para enfrentarmos os desafios do futuro.

GB – O crescimento da indústria no concelho não colocará em causa a marca de Vouzela ligada à preservação da natureza?

RL – Esta Carbon Team é amiga do ambiente, desde logo pelo produto que tem características evidentes de promoção ambiental, e quanto ao processo produtivo, apesar de não ser a minha área técnica, estou convencido pelo histórico, de há décadas, dos empresários envolvidos no projeto que têm toda a credibilidade para nos darem garantias ambientais, de criação de riqueza, de novas oportunidades, com a capacidade de continuarmos a poder fruir da nossa paisagem e da nossa natureza.

 

GB – Esta unidade industrial é um trunfo em ano de eleições autárquicas?

RL – Não estou nada preocupado com isso. Quem me conhece sabe que eu e a minha equipa damos tudo por convicção, desde o primeiro dia deste Executivo, pelo desenvolvimento da Região, com este e com outros projetos, como por exemplo o Plano de Sustentabilidade Turística, para capacitar os operadores a receberem com elevada qualidade os turistas vindos eles de onde vierem, de todo o Mundo, ou o Parque Natural que vamos continuar a impulsionar e sobre o qual teremos novidades em breve, com sinais muito positivos sobre o ordenamento do território e sobre os caminhos do futuro para o bem-estar das nossas comunidades.

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Portugal é o maior produtor europeu de bicicletas

Segundo os dados de 2019, Portugal é o maior produtor europeu de bicicletas, com dois milhões e 700 mil unidades fabricadas. As exportações nacionais ascenderam aos 400 milhões de euros e, para a ABIMOTA, a associação do setor, estes valores refletem o bom momento que o setor das duas rodas nacional atravessa.

É portuguesa a primeira empresa do mundo a soldar quadros em alumínio para bicicletas através de robôs, com as linhas de pintura mais avançadas. Também é portuguesa a empresa que faz os selins para bicicleta mais leves do mundo, bem como a maior fábrica de montagem de bicicletas e a maior fábrica de rodas para bicicleta da Europa. Agora, em Vouzela, começa a operar a primeira fábrica de quadros de carbono fora do continente asiático. Portugal está na linha da frente da produção de veículos para a mobilidade suave.

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Emre Ozgunes, diretor da Carbon Team, espera produzir 25 mil quadros por ano

O quadro em fibra de carbono para bicicletas da nova empresa instalada em Campia “foi projetado pela Art Collection e produzido em conjunto com a Bike Ahead na Alemanha”, explica Emre Ozgunes, director da Carbon Team, acrescentando que “este quadro MTB HT de 800 gramas (tamanho M) é 100% monocoque e não requer colagem. A estrutura já passou nos rigorosos testes de laboratório na Alemanha e é certificada”.

O responsável fabril explica ainda que “graças à implementação da Indústria 4.0, com um alto nível de digitalização, podemos alcançar 100% de rastreabilidade do processo de produção”.

“Estamos muito otimistas quanto ao futuro deste projeto” refere Emre Ozgunes. “A Carbon Team preenche uma importante lacuna na cadeia de abastecimento na Europa e pode tornar-se um ator-chave para a indústria como fornecedora de peças de fibra de carbono para bicicletas” a partir de Vouzela, conclui Emre Ozgunes.

As empresas portuguesas Rodi – que detém a maior fábrica de rodas para bicicletas da Europa, a Miranda & Irmão e Ciclo Fapril juntaram-se à alemã Bike Ahead Composites e à taiwanesa Art Collection para criarem o projeto Carbon Team, no qual investiram 8,4 milhões de euros para a criação da nova fábrica, em Vouzela, destinada à produção em grande escala para a Europa de quadros de bicicleta em fibra de carbono.

A fábrica tem 9.000 metros quadrados de área no Parque Industrial de Campia, com capacidade de expansão para mais 7.000. Entrou recentemente em operação e está na fase de testes. Espera-se que possa gerar vendas que cheguem aos 20 milhões de euros por ano, graças ao seu “nível muito alto de automação da produção” e à sua “capacidade para a produção de 25 mil quadros de carbono por ano”. O diretor da Carbon Team prevê poder atingir a sua capacidade máxima até 2024.

Ed. 802 (25/03/2021)


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