Entrevista a Celeste Bento

Vitivinicultora

“Gente Que Ousa Fazer”

 Entrevista a Celeste Bento

A rubrica “Gente Que Ousa Fazer “será assente numa entrevista a alguém que tenha algo válido no seu percurso de vida. Gente que sabe o que quer e, acima de tudo, que luta por aquilo que quer. As entrevistas serão sempre encaminhadas de forma a mostrar o lado melhor que há em cada um de nós e, dentro do possível, ousar surpreender o leitor. Serão entrevistas com a marca das nossas gentes, da região Viseu Dão Lafões, de todos os quadrantes e faixas etárias. Vamos a isso!

 

Ficha Biográfica

Nome: Celeste Bento

Idade: 62 anos

Onde vive: Quinta do Gato – São Pedro do Sul

Profissão: Vitivinicultora

Livro: Viver depois de ti – Jojo Moyes

Música: Que je t’aime – Johnny Hallyday

Destino de sonho: Itália

Personalidade que admira: Michelle Obama

 

Muito obrigada, Celeste Bento, por mostrar disponibilidade para esta entrevista da rubrica “Gente Que Ousa Fazer”. Comecemos pelo princípio.

Paula Jorge (PJ) – Pode descrever o seu percurso de vida?

Celeste Bento (CB) – Eu é que agradeço o convite para poder partilhar com os leitores um pouco de mim. Nasci na freguesia de Pinho, na aldeia de Mosteirinho. Muito nova, o meu falecido pai, Ilídio Bento ferreiro de profissão, comprou a Quinta da Gato localizada no limite do concelho, junto à N16 na reta dos cantoneiros (como era conhecida). Já casada, emigrei para a Suíça onde vivi perto de 25 anos na bela região entre Lausanne e Montreux, encosta vinícola do cantão de Vaud, com o meu marido e os meus dois filhos. A saudade de Portugal e da nossa terra sempre foram grandes e nunca perdemos a vontade de regressar às origens e aproveitar os vários hectares da Quinta do Gato para desenvolver o nosso sonho.

PJ – Juntamente com a sua família, tem um projeto de vinho “Lugar do Gato”. Quer falar-nos de como nasceu esta marca e como se tem implantado no mercado?

CB – A marca “Lugar do Gato” nasce inevitavelmente da ligação à nossa Quinta. Desde sempre que a quinta foi lugar de gatos e todos muito acarinhados. Por esse motivo ficou retratada no rótulo a nossa gata mais querida, a Pintas.

No que toca à implantação no mercado, nunca tivemos dúvidas de que a região de Lafões tem um terroir único que faculta características únicas e diferenciadoras aos vinhos. Como tal, desde o primeiro dia sempre nos associamos a esta bela região e fizemos questão de também ter no rótulo o nome de Lafões.

Ao logo de duas décadas fomos aprimorando técnicas e melhorando a produção de vinho até chegar ao início de 2021 e acharmos ser o momento certo para lançar no mercado as primeiras 333 garrafas de vinho branco Lugar do Gato – Edição limitada.

 

PJ – Fale-nos um pouco da história da Quinta do Gato.

CB – Podemos dizer que esta história inicia-se há mais de 55 anos quando o meu pai Ilídio decidiu adquirir esta propriedade com o nome “Quinta do Gato”.  Foi durante décadas terra de cultivo e de criação de gado como era tradição nessa época.

Volvidos largos anos e já com outra experiência de vida e de paixões, sem nunca descurar a memória do meu pai fomos dando maior estrutura à Quinta.

Nos meus anos longe da terra que me criou, as encostas vínicas de Lavaux – Suíça, que são património mundial da UNESCO e de beleza única, despertou à nossa família o gosto e a inspiração para a plantação da vinha.

Esta tem aproximadamente dois hectares e meio, foi implantada em socalcos, numa encosta solarenga da margem esquerda do rio Troço, um afluente do rio Vouga. A exposição solar e a proximidade do rio geram um microclima muito peculiar, que favorece a maturação das uvas.

PJ – No seu projeto tem uma preocupação ecológica e de proteção do ambiente. Em que medida isto acontece?

CB – As preocupações ecológicas nos tempos que correm são fundamentais para o bem de todos e também como forma de sustentabilidade da própria Quinta. São vários os animais que é asseiam por cá e como tal devemos ter em atenção o bem-estar deles.

É constante o cuidado no uso produtos o menos nocivos para o ecossistema. Temos também uma dezena de ovelhas a pastarem diariamente e livremente, como forma de limpeza natural dos terrenos e para a produção de fertilizantes.

 

PJ – Fale-nos da conquista da certificação dos seus vinhos (Branco, Tinto e Rosé).

CB – A certificação dos vinhos obedece a legislação específica que visa proteger a autenticidade dos produtos e suas origens.

Lafões, como sub-região de vinho do Dão, está na alçada das diretrizes da Comissão Vitivinícola da Região do Dão. Esta entidade certifica cada vinho produzido na região e atesta a sua conformidade mediante características há muito definidas.

Os nossos vinhos Lugar do Gato são certificados como Indicação Geográfica Terras do Dão, sub-região Terras de Lafões, ou seja, são vinhos produzidos em Lafões adquirindo o seu terroir, mas também com características do Dão.

Com a mesma certificação, mas de origem diferente da vinha, o nosso vinho branco provém das bordaduras dos terrenos, de videiras quase centenárias que foram cuidadosamente preservadas que dão um vinho delicado, com uma boa acidez, uma frescura crocante e um final de boca persistente.

PJ – Muitos visitantes a família tem recebido na Quinta do Gato. Como surgiu este iniciativa e qual o feedback que os visitantes lhe fazem chegar?

CB – Viver numa quinta é, no meu ver, um privilégio. É certo que requer muito trabalho, mas estarmos diariamente ligados à natureza, ao ar livre, ter espaço de vida e não estarmos sujeitos aos limites de um apartamento, como já estivemos longos anos na Suíça, é maravilhoso.

Assim, é com enorme gosto que partilhamos um pouco do nosso dia-a-dia, do trabalho ligado à vinha e ao vinho, com todos quantos nos visitam a título particular, mas também com as coletividades.

A partilha de momentos e experiências são de enriquecimento mútuo. Já recebemos e promovemos diversos momentos de atividades, desde as crianças do jardim escola a plantar cada um a sua árvore, ou grupos mais experientes dos centros de dia da região que vêm recordar a vida ativa no campo. Também tivemos o gosto de receber um dia de formação de um grupo do Instituto Politécnico de Viseu.

 

PJ – Quais têm sido as vitrines comerciais (feiras, festas, entre outros) do vinho “Lugar do Gato” e qual o impacto junto do público/clientes?

CB – Temos participado em vários eventos, o mais recente foi a convite da ASSOL na Conferência Internacional Gentle Teaching 2023 “Gentleness, Hope and Freedom”, onde participamos numa prova de vinhos e sabores locais, na Quinta da Capela – Campia. Foi com muito gosto que demos à prova, a dezena de participantes nacionais e estrangeiros, as nossas colheitas de Lugar do Gato 2022 tinto, branco e rosé, os quais receberam rasgados elogios.

Marcamos presença em diversos eventos e momentos a nível local, como nas festas da cidade de São Pedro do Sul, bem como noutros a nível regional.

A divulgação da nossa região e dos nossos produtos tem sido um desafio muito gratificante. Os vinhos Lugar do Gato têm participado em provas segas e degustações de diferentes revistas nacionais e individualidades do sector, recebendo avaliações muito positivas.

As redes sociais têm ajudado a promover a Quinta e os vinhos alem fronteiras e tem despertado o interesse de muitos.

Todo este trabalho faz com que Lafões e o vinho “Lugar do Gato” ganhe mais notoriedade e que seja solicitado pelos clientes, tanto na procura direta na Quinta como nos restaurantes onde temos os vinhos à venda.

 

PJ – Algumas histórias terá guardadas. Quer partilhar connosco uma das histórias que mais a marcou?

CB – Fruto da imagem da garrafa e nome “Lugar do Gato”, um dos nossos primeiros clientes foram uns proprietários de um negócio de criação de gatos de raça “maine coon”, intitulado “De la quinta do gato”, uma agradável coincidência com a nossa Quinta.

 

PJ – Quer falar-nos de alguns projetos que estejam para surgir a curto ou médio prazo?

CB – Atualmente o nosso foco essencial é a produção de novos vinhos que sejam diferenciadores e que tragam valor acrescentado à nossa gama e também a Lafões. É nesta época de vindima que planeamos e organizamos a colheita em função do produto final que pretendemos apresentar a médio prazo.

 

PJ – Para além de tudo o que já foi referido, que outras paixões nutre, que o completam enquanto pessoa?

CB – A minha vinha é uma grande paixão, mas não passa um dia que não pegue num livro e aproveito esses instantes para descansar, dar asas à imaginação e viajar nesses mundos criados pelo escritor.

 

PJ – Apenas numa palavra, pode descrever-se?

CB – Lutadora

 

PJ – Para fechar esta entrevista, o que me diz o seu coração?

CB – Pé ante pé, chegamos a grandes passos!

 

PJ – Quero, em meu nome pessoal e em nome da Gazeta da Beira, dizer-lhe que foi uma enorme honra, Celeste Bento! Desejo-lhe a continuação de um excelente trabalho e MUITO OBRIGADA! Peço-lhe que deixe uma mensagem breve a todos os nossos leitores.

CB – Agradeço mais uma vez o seu convite e aproveito para deixar um apelo a todos os leitores e entidades responsáveis, para haver uma efetiva estratégia na promoção de Lafões, dos seus produtos e suas gentes. Este pequeno território com grandes qualidades tem de mostrar todo o seu potencial para atrair investimentos e fixar pessoas. Não basta fazer disso discurso, mas sim envolver todos os agentes económicos, com planeamento, numa estratégia comum, aproveitar os investimentos privados para alavancar a região lafonense, à semelhança de outros territórios nacionais. Deixo esse repto e que o futuro seja de crescimento e de conquistas para todos. Bem hajam!

14/09/2023


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