Antonio Moniz Palme (Ed. 735)

O Marquês de Pombal e os seus Fantasmas de Estimação (1ª Parte)

Edição 735 (08/03/2018)

O Marquês de Pombal e os seus Fantasmas de Estimação (1ª Parte)

Estava eu no Parlamento, como deputado, pelo ano de 1981, quando a minha amiga e companheira de bancada, Natália Correia, me alvitrou, que a poderia acompanhar, num fim de semana, numa homenagem feita, na Póvoa de Varzim, ao Marquês de Pombal, após uma cerimónia em Pampolido, no Mindelo, recordando o desembarque dos liberais, no Norte, no Porto. A conhecida poetiza estava sentada ao meu lado, na primeira fila da bancada, na fronteira entre os lugares do PPM e do PSD., tendo com Ela conversas intermináveis sobre tudo e sobre todos, sendo criada uma amizade sincera entre os dois, passando a jantar juntos, nos dias de sessões nocturnas na Assembleia. Não lhe quis explicar as razões que impediam a minha presença na homenagem, mas invoquei um qualquer óbice familiar e Natália Correia acrescentou logo que compreendia perfeitamente, pois o Marquês tinha mandado trucidar barbaramente uma família inocente, para cúmulo ainda meus familiares. Fiquei de boca aberta com esta afirmação e esclareci que não era parente dos Távoras, ao contrário da Natália Correia que, pelo lado do marido, que ainda conheci, um primo do meu Tio D. Diogo Reriz, era aparentada com os Távoras. E desta base mantivemos uma conversa sobre o Marquês durante algum tempo, aproveitando os pontos mortos dos trabalhos parlamentares. As nossas opiniões acabaram por não ser muito diferentes.

Sebastião José de Carvalho e Melo, antes de ser Marquês de Pombal, título dado pelo Rei Sr. D. José, tinha casado com uma senhora austríaca, D. Leonor Dawn, senhora de uma enorme fortuna, naturalmente pessoa culta e que o despertou para as novas técnicas industriais, económicas e políticas existentes nas paragens europeias de onde era oriunda a sua família. Entretanto, a sua mulher faleceu e como o casal não tivesse filhos, entrou na posse dos avultados bens que constituíam a herança do cônjuge, passando dessa maneira a fronteira do pequeno círculo das pessoas com teres e haveres deste País. Foi para Londres em 1739, como enviado especial do Reino, por proposta de D. Luís da Cunha, tendo tido a ocasião de estudar concretamente novas experiências no aspecto das transformações havidas no mundo das transacções comerciais e de contactar as mais avançadas políticas de desenvolvimento industrial inglês. Em 1743, foi enviado para Viena, tendo aproveitado bem os rudimentos linguísticos que adquirira com a primeira mulher. Foi lhe dada a incumbência de mediar o conflito criado pela pouca inteligência e a criminosa discórdia dos representantes do Papa Benedito XIV e da Rainha da Boémia e da Hungria, a futura Imperatriz Maria Teresa, tia de Dona Maria Ana, mulher do Rei D. João V. Saiu-se bem desta incumbência e ainda conseguiu tirar a Espanha da órbita da França, durante a Guerra de Sucessão Espanhola. No regresso, orientou diplomaticamente a sua acção de responsável no sentido de manter um equilíbrio estratégico que lhe possibilitasse a defesa externa dos interesses portugueses, ao mesmo tempo que ia tomando medidas discretas para reforçar o Poder do Estado, aumentando o seu leque de competências, pois foi nomeado, por D. José, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, após a morte de D. João V. Até aqui tudo muito bem, ainda por cima viu a sua fama e poder aumentarem desmedidamente após o trágico terramoto com epicentro próximo de Lisboa em 1755. Além de organizar eficientemente, dentro das possibilidades existentes, o socorro aos sobreviventes, fez imediata frente aos ladrões que assaltavam as casa de gente que não tinha possibilidade de se defender e acautelar os respectivos bens, mandando executar imediatamente e no local quem fosse encontrado com bens que não lhe pertenciam ou que fosse visto a tentar forçar a casa do próximo, bem como os imóveis da Igreja e do Estado. E na reparação das consequências do Terramoto, iniciou a construção da Baixa Lisboeta, completamente arrasada, através de três técnicos excepcionais, Manuel da Maia, Eugénio dos Santos e Carlos Mardel. Foi na verdade um grande governante, talvez com uma gigantesca estátua em Lisboa correspondente não à sua categoria e ao serviço prestado, mas sim à sua ambição desmedida, tanto política como económica.

E aqui acaba o elogio que fiz do Marquês à minha saudosa amiga Natália Correia, passando a escalpelizar e a criticar facetas da sua actuação, invariavelmente com a sua concordância.

Segundo constava, o Marquês tinha medo do sobrenatural, embora as suas convicções religiosas fossem duvidosas, mais que não fosse porque pertencia a um grupo cujas ideias estavam na moda por toda a Europa e cujas crenças não eram positivamente muito “católicas”…!!! Daí a gente do Povo dizer em segredo que o Marquês acreditava em fantasmas. E tinha razão. Os Távoras para ele eram uns autênticos fantasmas que faziam permanente sombra ao seu egocentrismo e ao seu despótico desejo de mandar. Com tais entraves, como poderia o Marquês ter a aspiração de ser a figura mais rica do País e a mais importante na hierarquia social? Enfim, são feitios. Embora já fosse muito rico e já tivesse o título de Conde de Oeiras, muita gente havia que lhe tolhia inconscientemente a sua ambicionada ascensão, circunstância que José Carvalho e Melo não engolia com facilidade. D. João V tinha nomeado, em 1750, D. Francisco Assis e Távora, casado com a Marquesa de Távora, Srª Dona Leonor Tomásia, Vice-Governador da Índia, tendo feito um brilhante desempenho, não só no aspecto militar da manutenção e defesa dos interesses e territórios portugueses, como no aspecto diplomático. Lá chefiou uma expedição contra o célebre pirata Cananja, que assolava a navegação portuguesa em torno de Diu e fez frente ao Rei de Sonda que andava a bandear-se com os nossos inimigos. Regressou ao Reino em 1754. O seu prestígio suscitou a animosidade e a inveja de José Carvalho e Melo, Conde de Oeiras, que via nos Távoras um entrave irredutível às suas mesquinhas aspirações sociais de prosaico invejoso compulsivo. Na altura, corria que D. José andava a requestar Maria Teresa de Távora e Lorena, nora do velho Marquês, e casada com o filho deste, Luís Bernardo, 4º Marquês de Távora, o que desgostou grandemente a Família Távora, que passou a procurar distanciar-se da Corte, retirando-se para a Província, onde passou a viver.

Porém, em 1758, quando D. José clandestinamente voltava numa caleche de um encontro amoroso, foi a carruagem atacada por atiradores furtivos, tendo o Rei sido atingido num braço. E esta oportunidade surgida ou, como correu, preparada pelo próprio Pombal, foi aproveitada pelo homem forte do Reino, agora com a desculpa de se ver obrigado a actuar energicamente contra um crime de lesa majestade. Através de investigações e de provas que ninguém conhecia, declarou ter ficado provado que os Távoras e outros elementos da alta aristocracia, tinham mandado assassinar o Rei D. José. Em 13 de Janeiro de 1759, os Marqueses de Távora, o seu filho Luís Bernardo, um filho mais novo ainda infante, o Duque de Aveiro, o Conde de Atouguia e outros presumíveis responsáveis pela tentativa de assassinato do Rei, subiram ao patíbulo, em Santa Maria de Belém, onde foram barbaramente assassinados. A Marquesa foi degolada e os homens, após terem os braços e as pernas esmagados, foram garrotados. Os bens foram confiscados e declarada a inexistência da representação dos títulos dos supliciados. Apesar de tal, o Marquês obrigou uma descendente dos Távoras, D. Francisca de Paula do Pópulo de Lorena, filha de um dos Távoras, justiçado em Belém, a casar com um seu filho…! Inacreditável.

A Rainha D. Maria, após a morte de D. José, decretou por Alvará de 9. X.1790 a revisão do processo, mas a acção da justiça foi inexplicavelmente retardada, pois os juízes nomeados ainda tinham medo de decidir contra as ordens do Marquês e iam protelando o cumprimento da Ordem Régia, mais que não seja para não ficar provado que o tribunal tinha perdido a independência às mãos do ministro. Enfim, lá foi feita justiça e os Távoras considerados inocentes por nada ter sido provado. Os bens foram devolvidos à Família e o título de Marquês de Távora continuou a poder ser usado. Mas os fantasmas da Família continuaram a povoar os sonhos agitados do ex primeiro ministro, apesar de rodeado de esconjuros, fechado nas suas propriedades de Pombal.

Abrenúncio Satanás!!! Mas que foi um grande governante, lá isso foi, “malgré tout”, como diria um certo ministro da nossa praça…! Contudo, os Fantasmas dos Távoras não eram os únicos que perturbavam o sono do Marquês…! A ver vamos.


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