António Moniz Palme (Ed. 704)

Madeira, a verdadeira Atlântida, no que toca a beleza e mistério

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Após as desgraças que se abateram, na voragem de labaredas imparáveis, tanto no Continente, nomeadamente em S. Pedro do Sul, como na Madeira, não podia deixar de vir relembrar a beleza da nossa Pérola do Atlântico e o sortilégio do arquipélago que os maus ventos e a má vontade dos deuses invejosos do Olimpo pretenderam destruir.

E sobre os incêndios ocorridos não deixará de se escrever, passados que sejam o rescaldo e o arrefecimento da sensibilidade portuguesa ainda ao rubro, não se analisando a situação imediatamente de forma anárquica e apaixonada…. Mas interessa lembrar a todos que a Madeira, apesar de tudo, continua um paraíso e os maus tempos depressa serão alterados, esperando o Arquipélago, de braços abertos, a visita solidária de cada um de nós.

Aproveito para saudar os meus amigos madeirenses, principalmente os filhos dos meus primos, a sampedrense Maria Luiza Lacerda Machado, da Casa da Praça, e o marido, o madeirense Dr. Baltazar Gonçalves, a quem S. Pedro do Sul deve a pronta autorização e incentivo fundamental na construção do novo Balneário das Termas, quando o mesmo era Subsecretário de Estado do Governo então em exercício.

Peço desculpa por começar este artigo sobre a Madeira com a frase com que os nossos queridos professores primários entravam na matéria escolar sobre o Arquipélago, declarando pomposamente que, em 1419, oficialmente e em representação de El Rei de Portugal, João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz Teixeira, conjuntamente com Bartolomeu Perestrelo, descobriram Porto Santo e a Ilha da Madeira. Ora, mais que não seja, serve a mesma para nos fazer recordar com saudade o Professor da Primária de cada um de nós!!!. Hoje em dia, esta frase já não tem tanta importância, pois com a facilidade de transporte por avião, não há ninguém que não tenha feito uma passeata, pelos antigos domínios da perdida Atlântida Portuguesa, descobrindo as belezas locais, comendo o peixe espada negro, tirado das  profundezas  do mar, saboreando os bons bifes de atum, degustando o bolo do caco e as extraordinária bananas locais, evocando, como complemento, os valentes navegadores que fizeram a descoberta do Arquipélago, vencendo terríveis obstáculos. Igualmente recordando as heroicas e tenazes   populações que lá se fixaram e que durante séculos foram perseguidas pelo isolamento, pela fome e pela desolação, pelos ataques dos piratas, corsários ingleses, franceses e do Norte de África, que apareciam nas suas costas para aprisionarem os elementos da população portuguesa para os venderem como escravos.

O Arquipélago da Madeira é constituído pelas Ilhas da Madeira, do Porto Santo, das Selvagens e pelas Desertas.  Ali há uma permanente fraca amplitude térmica, que vai dos 15 a 22 graus, temperaturas que sempre atraíram os europeus de todas as nacionalidades, que lá se mantiveram por sucessivas gerações, dando um ar cosmopolita à Ilha e tornando-a conhecida em todo o mundo civilizado. Ainda por cima, tem um vinho fantástico, que em determinada faceta rivaliza com o vinho do Porto. O Infante D. Henrique importou, debaixo de mão, da Ilha de Candia (Creta), cepas que aí tinham altas produções e reconhecida boa qualidade, principalmente a Malvasia. Porém, outras castas foram introduzidas, desde a Boal, a Sercial, o Verdelho e, mais tarde, a casta Terrantez e a Terra Mole, cuja mistura produziram um excelente vinho, famoso em todo o mundo, pois passou a ser bebido em todas as Cortes da Europa, pelas respectivas elites…

A acrescentar, os bordados e os artigos de vime começaram a fazer parte da panóplia dos produtos manufacturados pela sua gente e que desde tempos imemoriais atraem e encantam os turistas.

Não posso deixar de falar na grande influência da produção da Cana do Açúcar, na economia da Ilha e do Continente. Na verdade, obtida por Tristão Vaz Teixeira uma permissão do Infante D. Henrique para importar e lá instalar um engenho hidráulico para a moenga das canas, passou o açúcar a ser uma das nossas maiores exportações. A Casa Real Portuguesa mandou presentes de açúcar a tudo que era cabeça coroada, eminência eclesiástica e a todos os magnates europeus. Bem depressa o açúcar entrou na moda gastronómica de toda a Europa. Às vezes num excesso de elegância e requinte exibicionista deitavam os apreciadores açúcar na sopa, talvez de feijão, e no cozido de carnes de porco, prática talvez de efeito um pouco enjoativo, mas o que é certo é que a procura de tal produto mudou de um dia para o outro o panorama económico português.  Os mercadores genoveses, judeus e marroquinos passaram a fazer praça em Lisboa para levarem o açúcar da Ilha da Madeira para os seus clientes. Pelos vistos, D. João II sabia mais de “marketing” do que muito exportador espertalhão e encartado dos nossos dias.

Mais outra bebida popular foi criada como consequência da produção do açúcar, a PONCHA, que conjuga a aguardente branca de cana, o mel e o sumo de limão. Ainda hoje se bebe correntemente por todo o Arquipélago.

Além do mais, o ar da Madeira é bom para diversos doentes. No século passado, os europeus com doenças pulmonares sentiam grande alívio nas estadias numa das Ilhas mais belas do panorama internacional e, ainda por cima, de fácil acesso.

Além da gastronomia portuguesa e do peixe pescado, nas suas claras águas azuis, havia o manancial constituído pelo Vinho da Madeira, essência dos deuses, que embarcava em barrica sem conta para todo o mundo, desde a Europa até aos confins da Ásia.

Atendendo às desgraças há pouco acontecidas, peço a todos que canalizem as suas viagens de férias para a belíssima Madeira. Pedindo desculpa deste abuso, em compensação, contarei uma história verdadeira que de qualquer modo valoriza o precioso néctar que é o seu Vinho.

O Irmão do Rei Eduardo IV de Inglaterra, Jorge Duque de Clarence, foi condenado pela Câmara dos Lordes à morte por afogamento. Porém, o sentenciado, como último desejo, exigiu morrer afogado num tonel de vinho malvasia da Ilha da Madeira. E esta…!

Espero que o executado tenha aproveitado bem e tenha entrado embalado, na Paz do Senhor…!

António Moniz Palme – Agosto de 2016

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